Depoimentos: o cotidiano dos moradores da favela
Raul Santiago: Eu sou Raul Santiago, tenho 28 anos, sou morador do Complexo do Alemão. Sou ativista de várias lutas da favela.
Wesley Brasil: Meu nome é Wesley Brasil, eu trabalho com comunicação na Baixada Fluminense, junto a coletivos culturais que pensam um novo imaginário, que pensam uma nova cidade, uma nova região, tá? A Baixada Fluminense é conhecida pela cultura do extermínio…
Mariluce Mariá: Meu nome é Mariluce Mariá, eu sou moradora do Complexo do Alemão, sou artista plástica, tenho um projeto chamado Favela Arte: a gente pinta as paredes da comunidade com aquela temática do desenho feito pelas crianças… Mesmo com toda a violência, a gente ainda tem coisas que a gente pode fazer pra transformar o lugar.
Fabiana: Me chamo Fabiana, é… Sou moradora da Rocinha, tenho uma página no Facebook chamada “Rocinha em Foco”. Os moradores é, reclamam muito é sobre a abordagem da polícia.
Raul Santiago: Hoje o Complexo do Alemão se resume em guerra. Então, qual o impacto disso na vida das pessoas, sabe? Qual… Que construção, que futuro a gente tá construindo dentro dessa realidade aqui?
Mariluce Mariá: As crianças, elas mudaram muito o comportamento delas, né? Porque tão deixando de ser criança: elas só conseguem associar o barulho e a violência que ela passa o tempo todo… Que é o barulho do tiro e as pessoas que circulam armada lá dentro, e isso tá afetando o crescimento, o desenvolvimento da criança.
Brendo: Meu nome é Brendo José do Nascimento Silva, tenho 12 anos, sou do 7º. ano. De manhã eu acordo, tomo banho e vou pra escola.
Mãe do Brendo: Nem sempre a gente tem como tá ali, no dia a dia, entendeu? Então, infelizmente, a criança tem que ser adulto antes do tempo. Com 9 anos, eu já assinei na escola pra ele vir sozinho. E sempre falando com ele: oh, cuidado pra atravessar, cuidado com isso, cuidado com aquilo, entendeu? Então, não só ele, mas como muita outras criança tem que aprender.
Repórter: O que é ser criança pra você?
Brendo: É muito bom, porque a gente pode se divertir, a gente pode brincar, a gente pode – no exemplo como eu, é… Fazer o judô…
Repórter: O que é a violência?
Brendo: A violência é… A gente num pode brincar, que do nada começa o tiroteio… A gente num pode se divertir, a gente num pode ir prum'a festa, porque se dá um tiroteio a gente num tem aonde se esconder. Pra mim, que é a violência: a gente num pode sair de casa pra comprar o pão, pra jogar u'a bola, pra mim treinar, num pode, por causa da violência.
Mãe do Brendo: Ah, o que acontece assim, às vezes, é sempre o horário, o horário… É sempre o horário que as criança vai pra escola, né, que às vezes tem tiroteio… Às vezes tem dia na semana que fica um dia, dois dia sem aula; ou então levo, quando chega no meio do caminho eu tenho que voltar com eles, porque a escola num abre, porque a diretora fica com medo, né, de abrir…
Brendo: Às vezes eu quero sair com a minha família mesmo, o tiroteio num deixa.
Mãe do Brendo: Ele fala que tem medo, né? Tem medo que um dia vai se… Um dia, um dia vai ser alguma coisa na vida pra poder tirar a família dele daqui, né, por causa dessa violência aí mesmo. Porque assim, é… O Brendo, ele já veio de um histórico de, assim, desde pequeno, uma coisa de… Um negócio de violência.
Brendo: Tem o meu pai… Que ele morreu no tráfico.
Repórter: Você se lembra dele?
Brendo: Quando ele morreu eu tinha 5 anos.
Repórter: E como é que foi isso?
Brendo: Triste, né?
Repórter: Você queria ter o seu pai? Quais são as coisas que você acha que poderia fazer com teu pai se ele fosse vivo?
Brendo: Ué, se ele num tivesse nessa vida… Se ele tivesse trabalhando assim, numa empresa. Mesmo se ele num tivesse num'a empresa, podia trabalhar numa tendinha… Mas, a vida de bandido num é muito fácil não. Fica o dia todo, a noite toda, a madrugada toda… Se meu pai tivesse vivo, acho que nem tempo pra mim ele ia ter, porque ele ia ficar nessa vida, entendeu?