Crise nas Forças Armadas e afago ao centrão: a reforma ministerial de Bolsonaro
Fragilizado em meio ao agravamento da pandemia e à queda de sua popularidade, o presidente
Jair Bolsonaro promoveu uma reforma ministerial na segunda-feira, 29 de março
Foram seis mudanças de cargo que representaram afagos ao Centrão e
uma tentativa de ampliar o alinhamento das Forças Armadas ao seu governo,
o que aumentou a preocupação sobre o uso político dos militares
Houve trocas no Ministério da Defesa, na Casa Civil, na Secretaria de Governo, no Ministério das
Relações Exteriores, no Ministério da Justiça e Segurança Pública e na Advocacia-Geral da União
Nesta terça, foi anunciado também que haverá substituição do comando das três Forças:
Exército, Marinha e Aeronáutica
Eu sou Mariana Schreiber, repórter da BBC News Brasil em Brasília, e vou te explicar essas
mudanças em dois pontos. Primeiro analisando a influência do Centrão e depois abordando
mais a fundo a mudança no Ministério da Defesa e nas Forças Armadas
Começando pelo papel do Centrão. A expectativa inicial na segunda era que apenas a troca do
comando do Itamaraty seria anunciada, com a demissão do ministro Ernesto Araújo, um
chanceler com perfil ideológico que rompeu com a tradição multilateral da diplomacia brasileira
Essa mudança já atendia à pressão de líderes do Centrão,
como o presidente da Câmara Arthur Lira, e de outras forças políticas do Congresso
Nas últimas semanas, parlamentares deixaram claro que não toleravam
mais a manutenção de Araújo e o culpavam pela lentidão na importação de vacinas
Sua substituição, então, se mostrou inevitável para o
governo manter sua governabilidade no Congresso
Para o lugar de Araújo foi anunciado o embaixador Carlos Alberto França,
um diplomata de pouca expressão que nunca chefiou uma Embaixada brasileira
Ele conquistou a confiança de Bolsonaro quando chefiou o cerimonial do Palácio do Planalto
Outra mudança que atendeu claramente os interesses do Centrão, foi a nomeação
da deputada federal Flávia Arruda, eleita no Distrito Federal pelo PL,
partido presidido por Valdemar da Costa Neto, um dos condenados no escândalo do Mensalão
Esposa do ex-governador do Distrito Federal José Roberto Arruda, também condenado por corrupção,
ela assume a Secretaria de Governo da Presidência da República, ministério no
coração do Palácio do Planalto, e passa a comandar a articulação política do governo Bolsonaro
Entrando no segundo ponto do vídeo,
vamos analisar a dança de cadeiras entre os ministros militares
Foi esse troca-troca que abriu espaço para a nomeação de Flávia Arruda,
já que o general Luiz Ramos foi deslocado da Secretaria de Governo para a Casa Civil
Ele entrou no lugar do general Braga Netto que, por sua vez,
assumiu o Ministério da Defesa, após a demissão de Fernando Azevedo
Essa mudança aumentou a preocupação sobre uma nova
investida de Bolsonaro com objetivo de usar as Forças Armadas politicamente
Segundo apuração da BBC News Brasil, Bolsonaro pediu sua saída do cargo por
estar insatisfeito com a falta de apoio público das Forças Armadas a bandeiras do governo
Essa pressão sobre as Forças Armadas acabou culminando nesta terça-feira no anúncio
de que os comandos de Exército, Marinha e Aeronáutica também serão substituídos
A troca considerada mais importante é a do comandante do Exército, Edson Pujol, que já
deu declarações públicas contra a entrada da política nos quartéis, desagradando Bolsonaro
Pujol tem um perfil diferente do seu antecessor no cargo, o general Villas Boas,
que se notabilizou por se intrometer na política e no Judiciário com declarações públicas
Na mais notória dessas falas, ele postou no Twitter em 2018 uma mensagem na véspera
do julgamento de um habeas corpus do ex-presidente Lula pelo STF,
o que foi visto como uma tentativa de pressionar o Supremo
Embora o ex-ministro da Defesa, Fernando Azevedo, tenha sim em alguns momentos demonstrado apoio
público a Bolsonaro, como no episódio em que sobrevoou ao lado dele uma manifestação com viés
antidemocrático no ano passado, o presidente queria um apoio maior das Forças Armadas
Ainda mais depois de um crescente isolamento do seu governo,
com a recente carta de empresários e economistas com críticas à condução da pandemia e também o
aumento da resistência dentro do Congresso e do Judiciário a políticas do Executivo
Nas palavras de uma fonte com trânsito no Alto Comando das Forças Armadas ouvida pela BBC News
Brasil: “Mais isolado, o presidente quer o apoio da espada, leia-se, do Exército”
Estudioso dos militares, o professor da Universidade de Brasília Juliano Cortinhas,
considera que a saída de Pujol é ainda mais preocupante que a de Azevedo"
Isso porque, no Brasil, o Ministério da Defesa,
criado em 1999, até hoje não assumiu de fato o controle das Forças Armadas — na prática,
são os comandos do Exército, da Marinha e da Aeronáutica que têm hierarquia sobre as tropas
Para Cortinhas, a troca de comando do Exército por um general mais alinhado
a Bolsonaro é um sinal ruim para democracia, considerando o perfil
autoritário do presidente, que em toda sua vida exaltou a Ditadura Militar
Para finalizar esse vídeo, vale registrar as outras duas trocas de ministério anunciadas ontem.
O novo ministro da Justiça e Segurança Pública é o delegado da Polícia Federal Anderson Torres,
substituto de André Mendonça, que volta para o comando da Advocacia-Geral da União
Torres é próximo da família Bolsonaro, mantendo relações
pessoais com dois filhos do presidente, o senador Flávio e o deputado Eduardo
No passado, ele chegou a ser contado para comandar a Polícia Federal,
mas seu nome foi vetado pelo então Ministro da Justiça Sergio Moro
Espero que esse vídeo tenha ajudado vocês a entender melhor a troca de ministros.
Obrigada pela audiência e até a próxima.