SAUDADE | EMBRULHA PRA VIAGEM
Upa, upa, upa! Vamos tomar sol, filho?
Nenê tem que tomar sol!
Nossa, filho! A rua tá lotada!
Cheia de motoboy fazendo entrega!
Que legal, né?
Um dia o papai vai criar coragem e descer com você lá no térreo.
Pra mostrar o motoboy ao vivo pra você.
Eles são tão bonitões, são tão fofos.
Um capacetão grandão assim, muito legal.
Sabe, filho, há muito tempo atrás,
muito tempo mesmo,
quando as outras pessoas também andavam na rua,
nossa, a gente não gostava de motoboy, não.
Até brigava com eles! É verdade, é verdade.
Eles brigavam, chutavam retrovisor do nosso carro.
Mas era uma época tão boa!
Tanta coisa boa! Tinha shopping center,
com aquelas aglomerações de gente.
Tudo pagando coisa cara.
Sabe uma coisa que o papai tem saudades?
Chamava fila! Nossa, fila era assim:
Ficava uma pessoa assim em frente à outra,
um montão de gente. As vezes demorava horas.
Aí sempre tinha uma tiazinha que queria puxar papo,
falar da vida dela pra você.
A gente brigava porque alguém queria furar a fila.
Uma aglomeração tão gostosa que era fila.
Sabe uma outra coisa que você ia gostar muito?
Chamava escola!
Nossa, escola era boa demais!
Era uma casona. Ficava um monte de criança lá.
As crianças aprendiam e brincavam.
Tinha um boleto caríssimo que a gente pagava,
mas valia muito a pena.
Hoje o papai pagaria uns três boletos desse
só pra você ter escola.
Outra coisa que papai adorava. Hora do rush!
Era um monte de carro as seis e meia da tarde.
Todo mundo, cada um no seu carro.
Ouvindo música, jornal. Aí abria o vidro,
gritava pro outro que parou na faixa.
Xingava sem medo de pegar corona.
"Não sei o quê, filho do não sei o quê lá!"
Chegava em casa só duas horas depois.
Uma época boa. Mas enfim, filho.
Chega de papo que agora você vai tomar banho com a mamãe,
e eu comprei quinze pacotinhos de figurinha
do Super Motoboy Galático pra colar com seu irmão!
Depois o papai vai assistir a live do Jornal Nacional.
Tem que se informar.
Como é que tá o corona, como é que estão as coisas.