Um estranho encontro de jovens: um fenômeno cultural?
A origem do rolezinho
Como começou a onda que se tornou o assunto do país, preocupa os governantes e provocou discussão até no Palácio do Planalto
Quem chega de metrô a Itaquera, no extremo leste da cidade de São Paulo, avista da janela do trem o Itaquerão. O estádio, que receberá a partida de abertura da Copa do Mundo de 2014, em 12 de junho, dá as boas-vindas a quem visita o bairro – e deverá se transformar, ao longo dos próximos meses, numa das imagens mais conhecidas do Brasil fora do país. A seu redor, Itaquera, lar de mais de 204 mil paulistanos, sofre profundas transformações. Além das obras do estádio, o aumento do poder de compra da nova classe média alterou a fisionomia do lugar. Atraído pelo novo momento econômico, o Shopping Metrô Itaquera foi o primeiro grande empreendimento a surgir na região, em 2007. Na semana passada, porém, a área comercial de 43.000 metros quadrados, erguida de frente para a arena, ganhou o noticiário de forma totalmente inesperada – sem nenhuma ligação com a Copa ou com a prosperidade da nova classe média. A palavra que saiu de Itaquera e ganhou o país foi “rolezinho”.
Foi assim: 6 mil jovens, a maioria deles com idade entre 14 e 17 anos, responderam pelo Facebook a um convite para se reunir e ouvir funk ostentação – variante do ritmo que exalta o consumo e as roupas de grife – no estacionamento do Shopping Metrô Itaquera, em 7 de dezembro. O shopping é o principal ponto de lazer da região. É ali que os adolescentes se encontram corriqueiramente, para ver os amigos, comer no McDonalds e ir ao cinema. Quando a reunião no estacionamento começou, a segurança do shopping tentou dispersar a garotada. Mas eles, em lugar de ir embora, rumaram para o interior do prédio. Quem lá estava pensou tratar-se de um arrastão, e a confusão se instalou.
E os brasileiros ouviram falar pela primeira vez do rolezinho, um fenômeno cultural que ocorre rotineiramente na periferia de São Paulo e que, até então, havia passado despercebido. Depois da correria no Shopping Metrô Itaquera, tudo mudou. O rolezinho foi sequestrado ideologicamente e virou palavra de ordem. Radicais de um lado viram uma tentativa de integração forçada dos excluídos. Radicais do outro lado tomaram o grupo de jovens como uma ameaça social, um exemplo de baderna a ser contida – pela força, se necessário. A rigor, não se trata nem de uma coisa nem de outra.
O rolezinho, segundo ÉPOCA apurou em longas conversas com seus participantes e organizadores, é um encontro de jovens marcado pelas redes sociais. Preferencialmente o Facebook. Pela rede social, milhares deles combinam uma data para ir ao shopping “curtir, tumultuar e tirar várias fotos”. O rolezinho começa na internet, e toda a sua mecânica depende da rede. Quem cria o evento – geralmente um garoto desconhecido – se ocupa de convidar gente famosa no bairro: meninas e meninos cujos perfis na rede social têm até dezenas de milhares de seguidores, que são chamados de “ídolos”. “Para funcionar, o rolezinho precisa ter o ídolo”, diz Matheus Lucas Bernardo, de 16 anos e mais de 30 mil fãs virtuais no Facebook. “Se chamar o ídolo, as meninas virão. E os meninos virão atrás das meninas.” Matheus foi ao shopping encontrar as garotas que o assediam nas redes sociais, suas fãs. Basta passear pelas fotos do garoto no Facebook para cruzar com declarações apaixonadas das meninas, que elogiam cada comentário que ele publica: “Elas me dão presentes. Uma já mandou um tênis de R$ 600”, diz ele. Com outros dois amigos, foi aos dois eventos marcados no Shopping Metrô Itaquera, mas diz que não quer mais participar – durante o último rolezinho, o boné de um amigo dele foi furtado.