SOCIEDADE

Então, eu pensei em deslocar esse slogan mais pra baixo...

Licença, seu Luiz. Acabei de enviar os arquivos pro cliente,

com todas as artes, os logos. Eles ficaram de responder até sexta.

Caso não, na segunda eu mesmo cobro deles.

Como na segunda? Tá maluco? Hoje é quinta.

É, mas hoje é véspera de feriado.

Eu e o André, a gente avisou, faz umas duas semanas,

que a gente vai viajar com as nossas famílias.

Não, desculpa gente, mas deu ruim.

A excursão fica pro próximo feriado.

Eu preciso de você e do André aqui amanhã sem falta.

Marquei o curso "Qualidade Criativa e o Núcleo Empresarial"

Vai durar a noite inteira isso aí.

Mas poxa, Seu Luiz, justo amanhã, véspera de feriado?

Porra, paguei metade do preço no curso.

Ninguém compra curso de feriado, vai ser ótimo.

E vocês prestem bastante atenção

e depois passa pra mim tudo na semana que vem, tá?

Como assim? O senhor não vai no curso?

Não, pelo amor de Deus.

Minha mulher não quer passar o feriado em São Paulo.

Eu não queria ir. Inclusive, vou ter que ir embora hoje,

olha como a Marginal tá aqui o trânsito.

Amanhã vai estar terrível.

Sorte de vocês que vão ficar aqui.

Bom, eu tenho que voar porque minha mulher tá esperando.

Mas, Seu Luiz, espera aí.

Mas se todo mundo meio que combinou de ir viajar,

por que a gente não troca o curso pra um outro feriado?

Ótima ideia hein, Fernando?

Faz isso quando tu tiver a tua empresa, tá bom?

Tô indo, amorzinho. Presta atenção no curso pra me passar.

Bom feriado, bom curso. Tchau, tchau. Até mais.

Esse cara é muito folgado.

Terceiro feriado que ele faz isso com a gente.

Por que a gente trabalha pra esse escroto?

Eu vou te falar mais, André. Se você for parar pra pensar,

a cartela de cliente inteire dessa agência quem trouxe foi a gente.

Fora que a gente é o criativo dessa bosta.

Ele só faz ficar sentado aí, pagando nosso salário.

Você sabe de uma coisa que eu já tava pensando tem um tempo, cara?

Por que a gente fica aqui engolindo sapo do Seu Luiz?

Sei lá, cara, vamos pedir demissão.

Vamos fundar nossa agência, porra!

Sabe que eu penso isso também?

Eu converso direto com a Giovana em casa sobre isso.

Bicho, a gente se dá bem pra caramba, a gente é irmão.

Vamos ficar sócios, porra.

De repente você fica com o comercial, e eu fico na área criativa,

-e a gente taca o pau. -Total. Vamos embora, cara.

Vamos fazer o seguinte, a gente, sei lá, divide as coisas.

Eu fico no criativo e você fica no comercial.

Não, é, a gente vê o que for melhor pra empresa.

Pelo menos RH a gente já tem.

A Giovana, formada em RH, cara.

Tá três, quatro anos disponível. A gente mete bronca.

Ou, você lembra daquele meu cunhado, o Rodrigo?

Que tava morando no Canadá?

Diretor de RH de uma multinacional fudida,

comandando a América Latina inteira.

Pediu demissão, voltou pro Brasil essa semana.

Eu tenho certeza que ele ia adorar estar nessa com a gente, cara.

A gente pode fazer assim: a Giovana fica como diretora de RH

e ele de repente vira gerente.

É, ou o oposto também. A Giovana de gerente, ele diretor.

Também não vou chamar meu cunhado de uma multinacional

pra ser gerente na empresa que eu sou proprietário, né?

Na verdade, você tem razão. melhor nem chamar ele.

A empresa tá começando agora, engatinhando no mercado.

Vira cabide de emprego, odeio esse tipo de política.

Exatamente, a gente nem mistura também você e sua esposa.

Não, minha esposa não porque ela é esposa do proprietário.

Não é o cunhado do proprietário, é diferente.

E eu também não tô chamando a minha esposa

porque ela é minha esposa.

Eu tô chamando porque a Giovana é uma puta de uma profissional.

Perfil que a gente precisa.

Você tá de brincadeira. Você ouviu o currículo do meu cunhado?

É, teu cunhado...

Assim, vamos pensar nele depois, depois a gente vê.

A gente tem que pensar no nome da empresa.

A gente não tem nem nome na nossa agência.

Pode deixar que hoje a tarde mesmo eu vou sentar,

e já vou bolar um logo, uma arte.

Alguma coisa que ao mesmo tempo seja leve, passe uma certa credibilidade.

Mas por que você vai criar isso? Também sou dono dessa bosta, ué.

Mas eu sou o criativo da empresa.

Quem disse que você é o criativo, cara?

Aqui na agência, nós dois somos do criativo.

Ah, André. Pelo amor de Deus, né?

Aqui tá todo mundo cansado de saber que você é fraco pra caralho de criação.

O Seu Luiz aqui só não te espirrou ainda

porque tem dó que você é pai de família.

Idiota, faz um ano que não entra uma campanha sua aqui na agência.

A empresa tá vivendo em cima do varejão que eu criei

e ainda conquistei o cliente.

Nossa, aliás, campanha genial, né? "Deu a Louca no Laranjão!"

Meu Deus, abram espaço na estante pra entrar o canne do garoto.

Todo mundo aqui sabe que você só fechou essa conta aí

porque você levou o gerente de marketing pro puteiro e pagou bola pra ele!

E você acha que nossa empresa vai viver do quê?

Das suas fantásticas criações?

Vai ficar pagando pra você ficar sentado com a bunda na cadeira

não criando porra nenhuma, cara? Ah, vai tomar no cu, rapaz.

Vai tomar no meio do seu cu você!

Vai ficar pagando pau pro cunhadinho, vai!

Vai se inscrever num supletivo pra ver se aprende a escrever uma campanha direito!

Pra mim, a sociedade acabou!

Graças a Deus! E que ótimo que amanhã eu tenho esse curso

assim eu não sou obrigado a passar meu feriado com você e sua família.

Idiota, eu faço o mesmo curso que você! Mas vou sentar longe, hein?!

Presta atenção e depois me passa tudo semana que vem.

Tchau gente, bom feriado.

Nossa senhora!