UBER | EMBRULHA PRA VIAGEM

Não é possível.

Tá que o motorista tá aqui do lado tem dez minutos e ele não chega.

Vou ter que cancelar.

Seu Mauro!

-É Mauro? -Isso.

Ufa! Vamos lá?

-Você? -Eu... Pedro, do Uber.

Oh louco, velho. Quer me matar do coração?

-Cadê o carro? -Carro... Então...

Isso que eu ia falar pro senhor. Nossa, rapaz, como eu corri!

O carro eu tive que deixar no mecânico ontem,

tava com um barulhinho estranho no escapamento, sabe?

Aqueles estouros.

Falei "ah, não vou arriscar, não, vou sem carro".

Mas eu preciso de um motorista com carro.

Ia ser mais fácil mesmo, né?

-Como assim, mais fácil? -O carro dá uma agilizada, né.

É que eu vi aqui pelo aplicativo

que você vai pra Vila Mariana.

Aí se a gente de repente vai a pé juntos aqui conversando

Aí, rapaz, 45 minutos a gente já tá lá!

Meu papo é bom, hein!

Você nem vai sentir o tempo passar!

Você tá de brincadeira comigo. Eu vou cancelar isso aqui.

-Não pode cancelar, não! -Calma, escuta!

O celular não, o celular é meu. Me devolve o meu celular.

O senhor tem noção?

O senhor me chamou eu tava lá na Avenida Bandeirantes!

Eu dei um pau pra chegar até aqui

que o cara do barzinho gritou "Pega ladrão!"

Mas eu não queria perder o cliente, né?

Você tá de brincadeira, cara. Isso não é possível!

Isso é a coisa mais bizarra que aconteceu na minha vida.

Bizarro?

Bizarro é você trabalhar com carro

e ele te deixar na mão no começo da semana.

Oh, seu Mauro, eu tenho dois filhos pra criar,

minha mãe agora tá morando comigo,

tá com gota, aquele negócio de artrose,

tem dia que ela fica na cama o dia inteiro, dá uma judiação aquilo!

E minha mulher trabalha de caixa de supermercado.

Quer dizer, não paga nem o condomínio.

Ficou tudo nas minhas costas!

Eu trabalhava numa empresa.

Tecnologia, tudo certinho, carteira assinada.

Mas essa crise aí, o que aconteceu, tive que ir pro aplicativo.

Fui mandado embora!

Meu amigo, a sua história é muito triste

mas sinceramente eu tô precisando de um carro

se não quem vai perder o emprego sou eu.

Seu Mauro, eu preciso da sua colaboração.

Entendeu? Eu preciso fazer o dia de hoje!

Nem que seja pra pagar o mecânico.

Aí todo mundo tá feliz! O que o senhor acha?

Tá, então vamos fazer o seguinte?

Você me devolve o celular

senão eu te dou uma porrada no meio da cara?

Ih, rapaz, pega o seu celular aí!

Não fica nervosinho não

que eu já te dou um na avaliação do aplicativo

e o senhor se queima lá na Uber!

Ainda por cima é cara de pau?!

Doutor, se a gente não tivesse brigando aqui,

andando, a gente já tava na Sena Madureira, no mínimo!

Você sabe que eu atendi uma velhinha hoje

83 anos, ouve bem, 83 anos.

Peguei ela em Santana, fomos até o Largo da Batata

três "condução" com ela.

Ela comendo balinha, tomando água.

-O senhor quer uma balinha? -Não, obrigado.

Entendeu? Não reclamou nada, contou a história do netinho dela,

vai fazer intercâmbio agora na Austrália,

tão bonitinho! Mostrou foto e tudo.

E o senhor, um homem feito, cheio de saúde,

com frescura pra andar até a Vila Mariana comigo?

Ah, faça-me o favor, né!

Pronto, amigo, cancelei.

Coração de pedra, né? Quer dizer, sentimentos o senhor...

Tem gente que a gente tem que entender que na vida...

Ó lá, corrida. Vou aceitar.

Porque tem gente que deve ter coração.

Você sabe me dizer... Avenida Ibirapuera 3018 fica onde?

É a quarta paralela à esquerda.

Mas pela numeração que você tá falando,

isso aí fica do lado do shopping.

Ibirapuera? O shopping? Puta que pariu, até mais!