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BBC News 2021 (Brasil), Documentário: BBC revela venda ilegal de terras na Amazônia pelo Facebook (2)

Documentário: BBC revela venda ilegal de terras na Amazônia pelo Facebook (2)

Depois da gravação, questionamos André sobre o conteúdo de sua fala, mas ele não respondeu

Mais da metade das áreas de floresta derrubadas viram pastagens na Amazônia

E assim como a madeira, bois criados em áreas derrubadas ilegalmente também podem entrar

nos mercados como se tivessem origem legal

Os bois são vendidos para fazendas que têm a documentação em dia

Nesse esquema, o gado de origem ilegal é misturado ao legal antes de chegar aos frigoríficos

Inclusive, aqui em Rondônia, a população do Estado é de 1,8 milhão

E o gado bovino, a gente tinha, até meados de 2019, 14 milhões (de cabeças)

Então são praticamente 9 a 10 cabeças de gado para cada habitante do Estado

Numa área de floresta, né?

A pecuária tem baixíssima produtividade na Amazônia: aqui, um boi ocupa cerca de

um hectare, em média

Em outras partes do Brasil, o mesmo espaço pode abrigar 10 cabeças de gado

No dia seguinte, encontramos a ambientalista Ivaneide Bandeira Cardozo

Ela luta contra o desmatamento em Rondônia há mais de 30 anos

Eu sou filha de seringueiros, então eu cresci na floresta

Então estar próximo da floresta, estar no rio é muito bom, é muito importante

É vida para mim, sabe?

Ivaneide quer nos mostrar uma área de floresta preservada – algo cada vez mais raro em Rondônia

Tá vendo aqui?

Aqui é uma pata de anta

Tá vendo?

E aqui tu tá em cima do caminho da paca

A ONG que ela fundou, Kanindé, trabalha com povos indígenas para ajudá-los a proteger

suas terras de invasores

Mas é perigoso ser um defensor da floresta aqui

Em 18 de abril, um indígena que fazia esse trabalho também de defender o meio ambiente

foi assassinado

Você conhecia ele?

Sim, eu ajudei...

Eu considerava ele como um filho

Ari era membro de uma comunidade que vive na maior terra indígena de Rondônia, a Uru-Eu-Wau-Wau

Ninguém foi preso pela morte dele

Eu me sinto revoltada...

Eu não gosto de falar

Eu me sinto revoltada, porque a Justiça não age, entendeu?

Não pune quem mata os ativistas, quem mata quem defende a floresta

Um relatório da ONG Global Witness apontou que 24 ativistas ambientais e dos direitos

humanos foram assassinados no Brasil em 2019

Dez deles eram indígenas

A Terra Indígena Uru-Eu-Wau-Wau abriga a maior área preservada de Rondônia, com tamanho

quase equivalente ao de Sergipe

Um paraíso de floresta cercado por fazendas

Viemos encontrar Bitaté, um dos líderes da comunidade

A gente dorme inseguro, não tem aquela segurança, entendeu?

É medo que alguém chegue e ataque a aldeia e nos ataque também

Bitate tem só 20 anos, mas sob sua liderança a comunidade criou um grupo para monitorar

invasores

Todos os meses a equipe faz expedições

Ari era um membro do grupo

A Fundação Nacional do Índio – Funai – órgão federal responsável por proteger os povos

indígenas, não tem uma base aqui

A unidade mais próxima fica a cerca de 200 quilômetros

A gente sabe que é muito arriscado esse trabalho, mas mesmo assim a gente está lá, protegendo

o nosso território, protegendo o que os mais antigos deixaram para a gente

Bitate diz que as invasões estão cada vez mais frequentes

Eu mostro pra ele o que descobrimos na nossa investigação

Isso aqui é um anúncio que a gente achou, de uma terra sendo vendida pelo Facebook,

dentro da terra indígena Uru-Eu-Wau-Wau

O que você acharia disso?

Uma terra, um pedaço de terra, grilado, sendo vendido pelo Facebook, dentro do território

de vocês?

Cara, eu acho que isso é uma falta de respeito, no meu ponto de vista

E eu acho que os órgãos deveriam tomar providência o mais rápido possível, entendeu?

Dá para ver no mapa mesmo, nesse ponto, que é dentro da terra indígena

Bem perto daqui

Na missão que fizemos saímos até nesse local que está indicado

O próprio Facebook deveria, vamos dizer assim, se responsabilizar pelo que ele vem fazendo

As invasões acontecem aqui com ou sem o Facebook

Mas a rede social faz com que invasores de áreas como essa tenham mais oportunidades

de fazer negócios

No dia seguinte, nosso agente Lucas deixa a cidade

O vendedor que encontramos no Facebook anunciando um pedaço de terra no território Uru Eu

Wau Wau concordou em encontrá-lo

Como os vendedores anteriores, ele pensa que Lucas trabalha para fazendeiros de São Paulo

Dos encontros que a gente teve até agora na minha avaliação foi o mais tenso

Ele tava suspeitando de vocês?

Ele tava suspeitando

Ele foi principalmente, de início, ele foi o mais cauteloso

A primeira coisa que Alvim Alves faz é mostrar vários documentos

Nenhum deles é um título da propriedade

Um dos documentos que ele exibe menciona a Associação Curupira

A associação foi descrita pela Polícia Federal como um grupo criminoso que pratica

desmatamento ilegal, grilagem e invasão de terras no território Uru Eu Wau Wau

E os grileiros agora estão com um novo modelo para avançar, para se apossar da terra, que

é criando associações de produtores rurais

Então, por trás, você tem políticos, você tem fazendeiros, você tem uma série de pessoas

grilando a terra indígena

Alvim Alves não nega que seu lote esteja dentro do território Uru Eu Wau Wau

Mas diz que a comunidade de Bitate não deveria ser a dona daquela área

Ele conversou, explicou a situação da área para a gente, falou que vai ser legalizado,

que existem alguns políticos ajudando eles

Que esse é o momento

O vendedor do lote convida nosso agente para encontrar um homem que ele diz ser um membro

de sua associação

Nós acompanhamos o deslocamento deles pela cidade

Lucas é apresentado a Edinario Batista

Como Alvim, ele tem lotes dentro da terra indígena Uru Eu Wau Wau

Fica claro que muitos grileiros veem Bolsonaro como um aliado

Como outras associações de grileiros, o grupo de Alvim e Edinario mantém contato

com políticos simpáticos ao agronegócio

Edinario diz a Lucas que hoje o principal aliado do grupo é um deputado federal que

os ajudou a marcar encontros com órgãos do governo em Brasília

É comum que políticos em campanha na Amazônia prometam ajudar pessoas a regularizar ocupações

ilegais de terra e a extinguir áreas protegidas

Procuramos Alvim e Edinario após as gravações e os questionamos sobre suas falas, mas eles

não quiseram se manifestar

Quando voltamos para Porto Velho, telefonamos para a equipe do deputado federal Coronel

Chrisóstomo, que concordou em nos receber no dia seguinte

Militar da reserva, o deputado federal Coronel Chrisóstomo se elegeu pela primeira vez em

2018 pelo PSL – o mesmo partido com que Bolsonaro chegou à Presidência

Alguns membros da Associação Curupira, que está envolvida nesse conflito, disseram que

o senhor é um grande apoiador da causa deles, que o senhor ajudou a organizar encontros

em Brasília com eles

É verdade?

Eles me procuraram, levei eles aos órgãos competentes, levei eles ao Incra, levei eles

ao Ministério do Meio Ambiente e à Funai

Então, os órgãos ficaram de conversar entre si para que pudesse resolver essa questão

O senhor sabia que o que eles estavam fazendo era ilegal, que eles estavam invadindo a terra?

O senhor apoiou mesmo assim?

Não sei, não sabia

Isso não me informaram

Se invadiram, já não têm meu apoio

O senhor, sendo deputado, sendo militar, o senhor não deveria ter uma posição um pouco

mais cautelosa ao contatar essas pessoas, ao fazer esses essa intermediação em Brasília

para elas?

Sem dúvida nenhuma

Quando as pessoas procuram o parlamentar, o parlamentar procura se embasar daquilo que

está sendo tratado

É natural

E nem tudo a gente sabe

O parlamentar, qualquer parlamentar, não sabe de tudo

Porque as pessoas trazem ao parlamentar aquilo que há interesse para ela

No nosso último dia em Rondônia, voltamos aos limites da terra indígena Uru-Eu-Wau-Wau

Esse aqui é o limite entre a terra indígena de fazendas

Eu vou pular...

Eu estou dentro da terra indígena, agora

Aqui só deveria ter floresta, mas também há fazendas desse lado

Como muitos aqui, Isaías e sua família não são de Rondônia

Eles vieram do Espírito Santo para cá nos anos 80, em busca de uma vida melhor

A ferramenta de trabalho é essa aqui

É… era uma, é uma região muito farta, né?

Tudo que você planta, produz com fartura

Então é o que chamou atenção do povo para essa região

É isso aí

Agora ele trabalha para o dono desta fazenda de gado

Ele tem... 320 cabeças de vaca

Aí dessa, dessas 320 cabeças, vamos supor que metade está parida, né?

A terra indígena Uru-Eu-Wau-Wau foi criada em 1991

Esta fazenda fica dentro dos limites do território demarcado

Qual o limite da fazenda?

O limite da fazenda aqui é a mata.

Aquela mata ali, e ali é o outro limite na mata também

Outra mata

Então quer dizer que está tudo rodeado de mata?

De mata

E quando é que essa área foi aberta?

Ah, deve ter a faixa etária de uns quinze a vinte anos

Eu não tenho certeza absoluta

A inação de sucessivos governos permitiu que uma área como essa, que fica dentro de

uma terra indígena, se tornasse uma fazenda consolidada

Órgãos veterinários do Estado chegam a visitar a área para vacinar o rebanho criado

ilegalmente dentro do território indígena

Hoje empregado, Isaías almeja um dia ter o próprio pedaço de terra

Uma propriedadezinha, pelo menos para a gente... fazer que não, morrer em cima do que é da

gente, né?

O Isaías é um cara trabalhador, um cara que tá tentando cuidar da família dele

Não tem nenhum luxo nessa vida que ele leva aqui

Ele veio de fora, mas ao mesmo tempo ele tem um papel no processo de desmatamento da Amazônia

Isso aqui era floresta antes

A história dele mostra como isso pode ser complexo

Não é sempre sobre o bom ou o mau

Tem muita coisa cinzenta aí no meio

De volta a São Paulo, mostramos os resultados de nossa investigação

ao ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles

Ele nos recebeu no escritório do Ibama na cidade

Nós entrevistamos alguns grileiros, com câmera escondida, e vários deles disseram que consideravam

o governo um aliado

Como o senhor se sente em relação à visão que essas pessoas têm do governo?

É preciso deixar claro o seguinte: o governo do presidente Jair Bolsonaro sempre deixou

claro que é um governo de tolerância zero a qualquer crime, inclusive os ambientais

Agora, isso não quer dizer que não possam ser discutidas algumas premissas da legislação

O que o governo vem defendendo desde o início de 2019 é que alguns aspectos da legislação

fundiária no Brasil precisam ser revistos

Por que então, ministro, os últimos dois anos tiveram os mais altos índices de desmatamento

em muito tempo?

O desmatamento dos anos 2019 e 2020 são mais ou menos um terço do que já foi em 2004

e 2005

Mas isso não quer dizer que estejamos satisfeitos com esse número

Ao contrário

É preciso combater as ilegalidades

Para combater as ilegalidades, há um conjunto de órgãos que se envolve – Ibama, ICMBio,

Polícia Federal, os Estados, todos eles juntos

O senhor não tem nenhuma autocrítica?

Já faz dois anos que o governo está no poder

Não houve nenhum erro, nenhuma ação que poderia ter sido diferente para que esses

números fossem melhores?

É preciso entender o problema da Amazônia nas suas diversas facetas

Uma delas é o desmatamento por uma questão de fiscalização

De outro, por outro lado, é a ausência de alternativa econômica

E o governo federal neste mandato vem colocando bastante força para que a agenda da bioeconomia

finalmente saia do papel

Nossa experiência em Rondônia mostra que a ação é urgente

A destruição da Amazônia se acelera

E agora o uso do Facebook permite que saqueadores da floresta alcancem mais compradores

Em nota, o Facebook afirmou: “Nossas políticas comerciais exigem que compradores e vendedores

cumpram as leis e regulações locais quando compram ou vendem no Marketplace

A empresa disse estar à disposição para trabalhar com as autoridades brasileiras em

qualquer uma das questões levantadas na investigação da BBC

No momento a gente tá perdendo a batalha, sim

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Documentário: BBC revela venda ilegal de terras na Amazônia pelo Facebook (2) Documentary: BBC reveals illegal land sales in the Amazon through Facebook (2) Documentario: la BBC rivela la vendita illegale di terreni in Amazzonia tramite Facebook (2)

Depois da gravação, questionamos André sobre o conteúdo de sua fala, mas ele não respondeu

Mais da metade das áreas de floresta derrubadas viram pastagens na Amazônia

E assim como a madeira, bois criados em áreas derrubadas ilegalmente também podem entrar

nos mercados como se tivessem origem legal

Os bois são vendidos para fazendas que têm a documentação em dia

Nesse esquema, o gado de origem ilegal é misturado ao legal antes de chegar aos frigoríficos

Inclusive, aqui em Rondônia, a população do Estado é de 1,8 milhão

E o gado bovino, a gente tinha, até meados de 2019, 14 milhões (de cabeças)

Então são praticamente 9 a 10 cabeças de gado para cada habitante do Estado

Numa área de floresta, né?

A pecuária tem baixíssima produtividade na Amazônia: aqui, um boi ocupa cerca de

um hectare, em média

Em outras partes do Brasil, o mesmo espaço pode abrigar 10 cabeças de gado

No dia seguinte, encontramos a ambientalista Ivaneide Bandeira Cardozo

Ela luta contra o desmatamento em Rondônia há mais de 30 anos

Eu sou filha de seringueiros, então eu cresci na floresta

Então estar próximo da floresta, estar no rio é muito bom, é muito importante

É vida para mim, sabe?

Ivaneide quer nos mostrar uma área de floresta preservada – algo cada vez mais raro em Rondônia

Tá vendo aqui?

Aqui é uma pata de anta Aquí hay una pata de tapir

Tá vendo?

E aqui tu tá em cima do caminho da paca

A ONG que ela fundou, Kanindé, trabalha com povos indígenas para ajudá-los a proteger

suas terras de invasores

Mas é perigoso ser um defensor da floresta aqui

Em 18 de abril, um indígena que fazia esse trabalho também de defender o meio ambiente

foi assassinado

Você conhecia ele?

Sim, eu ajudei...

Eu considerava ele como um filho

Ari era membro de uma comunidade que vive na maior terra indígena de Rondônia, a Uru-Eu-Wau-Wau

Ninguém foi preso pela morte dele

Eu me sinto revoltada...

Eu não gosto de falar

Eu me sinto revoltada, porque a Justiça não age, entendeu?

Não pune quem mata os ativistas, quem mata quem defende a floresta

Um relatório da ONG Global Witness apontou que 24 ativistas ambientais e dos direitos

humanos foram assassinados no Brasil em 2019

Dez deles eram indígenas

A Terra Indígena Uru-Eu-Wau-Wau abriga a maior área preservada de Rondônia, com tamanho

quase equivalente ao de Sergipe

Um paraíso de floresta cercado por fazendas

Viemos encontrar Bitaté, um dos líderes da comunidade

A gente dorme inseguro, não tem aquela segurança, entendeu?

É medo que alguém chegue e ataque a aldeia e nos ataque também

Bitate tem só 20 anos, mas sob sua liderança a comunidade criou um grupo para monitorar

invasores

Todos os meses a equipe faz expedições

Ari era um membro do grupo

A Fundação Nacional do Índio – Funai – órgão federal responsável por proteger os povos

indígenas, não tem uma base aqui

A unidade mais próxima fica a cerca de 200 quilômetros

A gente sabe que é muito arriscado esse trabalho, mas mesmo assim a gente está lá, protegendo

o nosso território, protegendo o que os mais antigos deixaram para a gente

Bitate diz que as invasões estão cada vez mais frequentes

Eu mostro pra ele o que descobrimos na nossa investigação

Isso aqui é um anúncio que a gente achou, de uma terra sendo vendida pelo Facebook,

dentro da terra indígena Uru-Eu-Wau-Wau

O que você acharia disso?

Uma terra, um pedaço de terra, grilado, sendo vendido pelo Facebook, dentro do território Una tierra, un pedazo de tierra, acaparado, vendido por Facebook, dentro del territorio

de vocês?

Cara, eu acho que isso é uma falta de respeito, no meu ponto de vista

E eu acho que os órgãos deveriam tomar providência o mais rápido possível, entendeu?

Dá para ver no mapa mesmo, nesse ponto, que é dentro da terra indígena

Bem perto daqui

Na missão que fizemos saímos até nesse local que está indicado

O próprio Facebook deveria, vamos dizer assim, se responsabilizar pelo que ele vem fazendo

As invasões acontecem aqui com ou sem o Facebook

Mas a rede social faz com que invasores de áreas como essa tenham mais oportunidades

de fazer negócios

No dia seguinte, nosso agente Lucas deixa a cidade

O vendedor que encontramos no Facebook anunciando um pedaço de terra no território Uru Eu

Wau Wau concordou em encontrá-lo

Como os vendedores anteriores, ele pensa que Lucas trabalha para fazendeiros de São Paulo

Dos encontros que a gente teve até agora na minha avaliação foi o mais tenso

Ele tava suspeitando de vocês?

Ele tava suspeitando

Ele foi principalmente, de início, ele foi o mais cauteloso

A primeira coisa que Alvim Alves faz é mostrar vários documentos

Nenhum deles é um título da propriedade

Um dos documentos que ele exibe menciona a Associação Curupira

A associação foi descrita pela Polícia Federal como um grupo criminoso que pratica

desmatamento ilegal, grilagem e invasão de terras no território Uru Eu Wau Wau

E os grileiros agora estão com um novo modelo para avançar, para se apossar da terra, que

é criando associações de produtores rurais

Então, por trás, você tem políticos, você tem fazendeiros, você tem uma série de pessoas

grilando a terra indígena

Alvim Alves não nega que seu lote esteja dentro do território Uru Eu Wau Wau

Mas diz que a comunidade de Bitate não deveria ser a dona daquela área

Ele conversou, explicou a situação da área para a gente, falou que vai ser legalizado,

que existem alguns políticos ajudando eles

Que esse é o momento

O vendedor do lote convida nosso agente para encontrar um homem que ele diz ser um membro

de sua associação

Nós acompanhamos o deslocamento deles pela cidade

Lucas é apresentado a Edinario Batista

Como Alvim, ele tem lotes dentro da terra indígena Uru Eu Wau Wau

Fica claro que muitos grileiros veem Bolsonaro como um aliado

Como outras associações de grileiros, o grupo de Alvim e Edinario mantém contato

com políticos simpáticos ao agronegócio

Edinario diz a Lucas que hoje o principal aliado do grupo é um deputado federal que

os ajudou a marcar encontros com órgãos do governo em Brasília

É comum que políticos em campanha na Amazônia prometam ajudar pessoas a regularizar ocupações

ilegais de terra e a extinguir áreas protegidas

Procuramos Alvim e Edinario após as gravações e os questionamos sobre suas falas, mas eles

não quiseram se manifestar

Quando voltamos para Porto Velho, telefonamos para a equipe do deputado federal Coronel

Chrisóstomo, que concordou em nos receber no dia seguinte

Militar da reserva, o deputado federal Coronel Chrisóstomo se elegeu pela primeira vez em

2018 pelo PSL – o mesmo partido com que Bolsonaro chegou à Presidência

Alguns membros da Associação Curupira, que está envolvida nesse conflito, disseram que

o senhor é um grande apoiador da causa deles, que o senhor ajudou a organizar encontros

em Brasília com eles

É verdade?

Eles me procuraram, levei eles aos órgãos competentes, levei eles ao Incra, levei eles

ao Ministério do Meio Ambiente e à Funai

Então, os órgãos ficaram de conversar entre si para que pudesse resolver essa questão

O senhor sabia que o que eles estavam fazendo era ilegal, que eles estavam invadindo a terra?

O senhor apoiou mesmo assim?

Não sei, não sabia

Isso não me informaram

Se invadiram, já não têm meu apoio

O senhor, sendo deputado, sendo militar, o senhor não deveria ter uma posição um pouco

mais cautelosa ao contatar essas pessoas, ao fazer esses essa intermediação em Brasília

para elas?

Sem dúvida nenhuma

Quando as pessoas procuram o parlamentar, o parlamentar procura se embasar daquilo que

está sendo tratado

É natural

E nem tudo a gente sabe

O parlamentar, qualquer parlamentar, não sabe de tudo

Porque as pessoas trazem ao parlamentar aquilo que há interesse para ela

No nosso último dia em Rondônia, voltamos aos limites da terra indígena Uru-Eu-Wau-Wau

Esse aqui é o limite entre a terra indígena de fazendas

Eu vou pular...

Eu estou dentro da terra indígena, agora

Aqui só deveria ter floresta, mas também há fazendas desse lado

Como muitos aqui, Isaías e sua família não são de Rondônia

Eles vieram do Espírito Santo para cá nos anos 80, em busca de uma vida melhor

A ferramenta de trabalho é essa aqui

É… era uma, é uma região muito farta, né?

Tudo que você planta, produz com fartura

Então é o que chamou atenção do povo para essa região

É isso aí

Agora ele trabalha para o dono desta fazenda de gado

Ele tem... 320 cabeças de vaca

Aí dessa, dessas 320 cabeças, vamos supor que metade está parida, né? |||||||||parida -> parida|

A terra indígena Uru-Eu-Wau-Wau foi criada em 1991

Esta fazenda fica dentro dos limites do território demarcado

Qual o limite da fazenda?

O limite da fazenda aqui é a mata.

Aquela mata ali, e ali é o outro limite na mata também

Outra mata

Então quer dizer que está tudo rodeado de mata?

De mata

E quando é que essa área foi aberta?

Ah, deve ter a faixa etária de uns quinze a vinte anos

Eu não tenho certeza absoluta

A inação de sucessivos governos permitiu que uma área como essa, que fica dentro de

uma terra indígena, se tornasse uma fazenda consolidada

Órgãos veterinários do Estado chegam a visitar a área para vacinar o rebanho criado

ilegalmente dentro do território indígena

Hoje empregado, Isaías almeja um dia ter o próprio pedaço de terra

Uma propriedadezinha, pelo menos para a gente... fazer que não, morrer em cima do que é da

gente, né?

O Isaías é um cara trabalhador, um cara que tá tentando cuidar da família dele

Não tem nenhum luxo nessa vida que ele leva aqui

Ele veio de fora, mas ao mesmo tempo ele tem um papel no processo de desmatamento da Amazônia

Isso aqui era floresta antes

A história dele mostra como isso pode ser complexo

Não é sempre sobre o bom ou o mau

Tem muita coisa cinzenta aí no meio

De volta a São Paulo, mostramos os resultados de nossa investigação

ao ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles

Ele nos recebeu no escritório do Ibama na cidade

Nós entrevistamos alguns grileiros, com câmera escondida, e vários deles disseram que consideravam

o governo um aliado

Como o senhor se sente em relação à visão que essas pessoas têm do governo?

É preciso deixar claro o seguinte: o governo do presidente Jair Bolsonaro sempre deixou

claro que é um governo de tolerância zero a qualquer crime, inclusive os ambientais

Agora, isso não quer dizer que não possam ser discutidas algumas premissas da legislação

O que o governo vem defendendo desde o início de 2019 é que alguns aspectos da legislação

fundiária no Brasil precisam ser revistos

Por que então, ministro, os últimos dois anos tiveram os mais altos índices de desmatamento

em muito tempo?

O desmatamento dos anos 2019 e 2020 são mais ou menos um terço do que já foi em 2004

e 2005

Mas isso não quer dizer que estejamos satisfeitos com esse número

Ao contrário

É preciso combater as ilegalidades

Para combater as ilegalidades, há um conjunto de órgãos que se envolve – Ibama, ICMBio,

Polícia Federal, os Estados, todos eles juntos

O senhor não tem nenhuma autocrítica?

Já faz dois anos que o governo está no poder

Não houve nenhum erro, nenhuma ação que poderia ter sido diferente para que esses

números fossem melhores?

É preciso entender o problema da Amazônia nas suas diversas facetas

Uma delas é o desmatamento por uma questão de fiscalização

De outro, por outro lado, é a ausência de alternativa econômica

E o governo federal neste mandato vem colocando bastante força para que a agenda da bioeconomia

finalmente saia do papel

Nossa experiência em Rondônia mostra que a ação é urgente

A destruição da Amazônia se acelera

E agora o uso do Facebook permite que saqueadores da floresta alcancem mais compradores

Em nota, o Facebook afirmou: “Nossas políticas comerciais exigem que compradores e vendedores

cumpram as leis e regulações locais quando compram ou vendem no Marketplace

A empresa disse estar à disposição para trabalhar com as autoridades brasileiras em

qualquer uma das questões levantadas na investigação da BBC

No momento a gente tá perdendo a batalha, sim