O Brasil que o governo Bolsonaro herdou em cinco áreas
[Oct 29, 2018].
Que Brasil o novo presidente vai herdar?
Eu sou Nathália Passarinho, da BBC News Brasil aqui em Londres e hoje vou detalhar qual vai ser essa herança em cinco áreas fundamentais e mostrar como o Brasil se compara em indicadores internacionais.
Vamos começar com economia.
No começo do segundo mandato do governo Dilma Rousseff, o Brasil parou de crescer.
Em 2015 e 2016, o produto interno bruto, que é basicamente o tamanho da nossa economia diminuiu 3,5%.
No ano passado, a economia saiu da recessão, mas cresceu só 1%.
Sem contar com a Venezuela, que está passando por uma crise gravíssima, o nosso é o pior resultado de toda a América do Sul.
Este ano, a previsão do FMI é que o Brasil cresça 1,4%.
Ou seja, o ritmo de recuperação é muito lento.
E outros indicadores econômicos também preocupam como o rombo nas contas públicas.
Por vários anos, o Brasil conseguiu fechar contas no azul e cumprir metas de superávit primário.
Isso quer dizer que conseguiu inclusive economizar para pagar juros da dívida.
Mas, a partir de 2014, isso começou a mudar.
No ano passado, o déficit nas contas públicas, que inclui governo federal estados e municípios, alcançou R$ 110,5 bilhões.
Este ano a previsão é de um rombo de mais de R$ 161 bilhões.
Para cobrir isso? - Mais dívidas.
Ou seja, resolver essa equação vai ser uma das tarefas do próximo presidente.
Outro indicador econômico que ainda preocupa é a taxa de desemprego.
De 2010 a 2014, a taxa de desemprego se manteve baixa.
Chegamos inclusive ao chamado pleno emprego.
Mas, de 2014 para cá, o percentual praticamente dobrou.
No ano passado, a taxa de desemprego do Brasil foi de 11,8% foi a pior de toda a América Latina, atrás apenas do Haiti, com 14%.
Entre jovens brasileiros de 18 e 24 anos, o percentual de desempregados alcança 26%.
São quase 13 milhões de pessoas procurando trabalho.
Especialistas dizem que a informalidade tem aumentado, assim como o grupo dos chamados desalentados, que são as pessoas que acabaram desistindo de procurar emprego por acharem que não existem oportunidades.
Como a taxa mede a procura por emprego, quando a pessoa desiste, pode dar a aparência equivocada de que a situação melhorou.
Por outro lado, a inflação do Brasil está dentro daquela antiga meta de 4,5% abandonada no segundo governo Dilma.
Segundo o último relatório Focus, divulgado pelo Banco Central a inflação deve alcançar 4,43% esse ano.
Ou seja, fica agora o desafio para o novo governo de equilibrar as contas públicas, gerar emprego e ao mesmo tempo crescimento econômico para o Brasil.
E isso sem gerar inflação.
Tá tranquilo, né?
O lado bom é que a taxa básica de juros, não a que o banco cobra de mim e de você que essa continua lá no alto.
Bom, mas a taxa selic está entre as mais baixas da nossa história, hoje em 6,5%.
O próximo tópico - saúde.
Os investimentos em saúde diminuíram nos últimos três anos.
Em 2018 o país gastou 3,6% do PIB nesse setor.
Vamos comparar com o resto do mundo para ficar mais claro.
O Brasil gasta por pessoa em saúde um pouco mais que o México e a Colômbia.
Mas em nível global não está nada bem.
Gasta um pouco mais que a metade que Portugal investe por habitante.
O Reino Unido gasta três vezes mais por habitante.
E olhe à distância para o primeiro colocado.
Os Estados Unidos gastam quase 7 vezes mais que o Brasil per capita em saúde.
Qual o efeito disso?
Você já viu gente de maca e cadeira de rodas nos corredores dos hospitais?
Pois é. Para você ter uma idéia, nos últimos oito anos, de 2010 a 2018 a rede pública de saúde perdeu 34 mil leitos de internação.
Segundo o Ministério da Saúde, isso significa 12 leitos hospitalares fechados a cada dia por falta de dinheiro para manter.
Inacreditável, né?
Agora, educação.
Bom, é o consenso internacional que se um país quer se desenvolver é essencial investir muito e bem em educação.
Em 2018, foram cortadas 200 mil bolsas de pesquisa do CAPES que financiava estudantes de pós-graduação.
Mas é no ensino médio e básico que tá o maior problema segundo os especialistas.
O novo governo vai herdar um país com mais jovens na escola e uma população com uma média maior de anos de escolaridade.
O problema é a qualidade desse ensino.
Em 2015, o Brasil teve a pior nota da América do Sul no teste de matemática do Pisa que é o principal exame internacional para medir a qualidade da educação em todo o mundo.
Aliás, na América Latina, como em todo, o Brasil só foi melhor que a República Dominicana.
Olha Chile, Argentina e Uruguai, por exemplo se saíram bem melhores que a gente.
E mais, entre as 70 nações que fizeram as provas de ciências, matemática e leitura do Pisa, o Brasil parece lá em baixo entre os dez países com os piores resultados.
Uma coisa que me chamou a atenção quando entrevistei o diretor de educação da o OCDE que foi quem criou o pisa, o Andreas Schleicher, é que a situação do Brasil não é muito melhor nas escolas particulares.
Ele disse, por exemplo, que os 10% mais ricos do Brasil vão tão bem nas provas que os 10% mais pobres do Vietnã.
Segurança pública.
Nunca se matou tanto no Brasil.
No ano passado foram 63.880 homicídios segundo o Fórum Nacional de Segurança Pública.
Esse ranking de 2016 da ONU mostra uma comparação do Brasil com outros países da América Latina.
A gente aparece como o terceiro país da América do Sul com mais mortes violentas por 100 mil habitantes.
São 31 homicídios em cada grupo de 100 mil pessoas, a gente só está melhor que Colômbia e Venezuela.
Os dois países mais seguros do mundo são Luxemburgo e Cingapura com 0,2 mortes violentas a cada 100 mil habitantes.
Não é à toa que a violência foi um dos temas centrais da campanha para presidente da República.
O último tópico - corrupção.
Esse é para muita gente um dos principais problemas do Brasil porque acaba afetando a eficiência de todos os itens que a gente citou antes.
Se dinheiro público é desviado, sobra menos para saúde, educação, e por aí vai.
Bom, é difícil medir o quão corrupto é um país.
Mas os vários escândalos de corrupção que a gente acompanha no noticiário dão uma pista de como é o nosso.
Em 2017, o Brasil caiu 17 posições no ranking do Índice de Percepção da Corrupção que mede o quanto a população encara o próprio país como corrupto.
Ou seja, aumentou a percepção entre a população brasileira de que existe muita corrupção no Brasil.
Aí fica aquela disputa - sempre foi corrupto ou aparece mais agora porque as investigações estão acontecendo?
O desafio do próximo presidente vai ser resolver não a pergunta mas sim o problema.
Nosso país aparece na posição 96 de uma lista de 180 países do menos corrupto para o mais corrupto.
É visto como o mais corrupto, por exemplo, que Timor-Leste, Senegal e Marrocos, entre outros.
Considerando todos esses pontos, não é exatamente a herança que alguém gostaria de receber.
Mas o Brasil já esteve em situação bem difícil no passado e melhorou em vários pontos.
Só lembrar, por exemplo, da hiperinflação e da taxa de analfabetismo de 25% nos anos 80.
Ou seja, o desafio é grande mas é possível e depende de política pública e de investir de forma inteligente.
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