Covid-19: Três causas do alto índice de mortes de jovens no Brasil
Um boletim recente da Fundação Oswaldo Cruz, a FioCruz, alertou para o “rejuvenescimento”
da pandemia de covid no Brasil.
Ou seja, mais jovens estão morrendo em decorrência da doença no nosso país.
E pior: o novo coronavírus está matando, proporcionalmente, muito mais pessoas abaixo
de 39 anos no Brasil do que no restante do mundo.
Mas por quê?
Eu sou Luís Barrucho, repórter da BBC News Brasil em Londres, e neste vídeo eu vou explicar
três causas para isso.
Vamos primeiro aos dados.
Em março, morreram 3.349 pessoas entre 30 a 39 anos de covid, quatro vezes mais do que
em janeiro.
E o número de mortes entre 20 e 29 anos pulou de 245 para 887 no mesmo período, um aumento
de 260%.
Os dados são do Portal da Transparência do Registro Civil, que reúne informações
dos cartórios por todo o país.
Desde o início da pandemia, foram registradas cerca de 20 mil mortes por covid abaixo de
39 anos no Brasil, ou 5% do total de cerca de 400 mil.
Essa taxa é mais de três vezes maior que a dos Estados Unidos (1,5%).
No Reino Unido, ela é de apenas 0,64%.
À medida que os mais velhos estão sendo vacinados, os óbitos nessa faixa etária
caíram pela metade.
Atualmente, mais de um terço das mortes por covid-19 no Brasil acontece entre aqueles
que têm menos de 59 anos.
Exemplo triste disso é o ator Paulo Gustavo, que morreu aos 42 anos.
Ele estava internado desde março.
Dito isso, vamos às causas que explicam as mortes de covid entre os mais jovens.
A primeira delas é um comportamento mais arriscado.
Desde o início da pandemia, sabemos que os mais jovens são menos propensos a desenvolver
os sintomas mais graves da doença e morrer por complicações dela.
De maneira geral, por causa da idade, temos a nosso favor um sistema imunológico mais
forte, o que facilita o combate ao vírus.
A exceção são aqueles que têm algum tipo de comorbidade, ou doença associada, como
obesidade ou diabetes.
Mas isso não quer dizer que os jovens estejam imunes à doença - e essa falsa percepção
acaba encorajando uma maior exposição ao risco.
Em outras palavras: os jovens se aglomeram com mais frequência e ignoram medidas importantes
de prevenção, como uso de máscaras e distanciamento social.
Quantas vezes não vimos no noticiário e nas redes sociais imagens de festas clandestinas
interrompidas pela polícia… A segunda causa é a volta ao trabalho.
Os mais jovens compõem a maior parte da população economicamente ativa.
Ou seja, aqueles que trabalham ou que estão procurando emprego.
Se de um lado o auxílio emergencial pago pelo governo ajudou a complementar a renda
das famílias brasileiras, a redução do valor do benefício obrigou muitos desses
jovens a voltarem às ruas.
O impacto maior acaba sendo nas classes menos privilegiadas e, mais particularmente, nos
negros, segundo um estudo realizado pela consultoria global de saúde Vital Strategies em parceria
com o Afro-CEBRAP, um instituto de pesquisa em questões raciais sediado em São Paulo.
Esse estudo analisou o chamado excesso de mortalidade, um índice que reflete o número
de mortes acima do esperado, ou seja, associadas à pandemia.
Entre pretos e pardos, a taxa foi de 28% no ano passado.
Entre pessoas de cor branca, 18%.
Ou seja, morreram proporcionalmente mais negros do que brancos em 2020.
Na faixa etária até 29 anos, essa taxa foi de 32,9% entre os negros e 22,6% entre os
brancos.
Já entre 30 e 59 anos, foi maior ainda: 37% entre os negros e 32% entre os brancos.
Em geral, no ano passado foram 270 mil 'mortes em excesso', ou 22% a mais que o normal.
E terceira e última causa vou listar neste vídeo é a variante P1.
Desde que foi descoberta em Manaus, em janeiro deste ano, a P1 logo se alastrou pelo Brasil
e se tornou preponderante.
Ela é até 2,4 vezes mais transmissível do que outras linhagens do coronavírus e,
segundo estudos recentes, pode "driblar" o sistema imunológico, infectando novamente
quem já teve a doença e levando a quadros mais graves.
Evidências associam essa nova variante ao maior número de hospitalizações e mortes,
especialmente jovens.
Lembra do que eu falei no início do vídeo?
De que a pandemia está rejuvenescendo no Brasil?
Vejam o que os especialistas dizem no boletim.
"O número de casos, hospitalizações e mortes entre pessoas com menos de 60 anos cresce
mais rápido do que em idosos.
O risco, portanto, para incidência e mortalidade vem aumentando gradativamente para quem não
é idoso e é, via de regra, saudável", foi isso que os pesquisadores disseram.
"Este deslocamento de casos e óbitos sugere que a pandemia ganha um novo contorno no Brasil,
ficando mais rejuvenescida".
Segundo a Fiocruz, como os jovens têm um sistema imunológico mais forte, combatem
melhor a doença e demoram muitos mais para se curar ou, eventualmente, morrer.
Resultado: acabam ficando mais tempo na UTI e ocupando leitos que poderiam ser destinados
àqueles que mais precisam deles, ou seja, os idosos ou pessoas com doenças associadas.
Por isso a Fiocruz disse que essas diferenças de incidência entre as faixas etárias "implicam
num compromisso intergeracional".
Vamos voltar ao relatório: "Sendo a infecção mais comum entre os jovens
e os óbitos mais frequentes em mais idosos e pessoas com doenças crônicas, uma geração
deve procurar proteger a outra, evitando o contágio de membros da família, vizinhos,
companheiros de trabalho e amigos."
Agora, é claro.
Mesmo com mais infecções e mortes entre os jovens, tudo isso poderia ser evitado se
o Brasil tivesse vacinado mais pessoas.
Eu fico por aqui.
Se cuidem.
E até a próxima!