A política de valorização do salário mínimo I O ASSUNTO I g1
O Brasil venceu o desafio de crescer econômico e socialmente e provou que a melhor política
de desenvolvimento é o combate à pobreza.
Nosso modelo de governo também permitiu que o salário mínimo tivesse ganho real de 67%.
Promovemos a maior ascensão social de todos os tempos, retirando 28 milhões de pessoas
da linha da pobreza e fazendo com que 36 milhões entrassem na classe média.
Foi assim que Lula se despediu do seu segundo mandato, em dezembro de 2010.
Treze anos depois, a política de valorização do salário mínimo foi central no discurso
do presidente no dia do trabalho, no último 1º de maio.
Recompor as conquistas perdidas pelos trabalhadores e trabalhadoras é prioridade do nosso governo.
A começar pela valorização do salário mínimo, que há seis anos não tinha aumento real
e vinha perdendo o poder de compra dia após dia.
No entanto, o Brasil de agora é muito diferente daquele de mais de uma década atrás.
Mais de 62 milhões de pessoas estavam na pobreza em 2021.
Desse total, 18 milhões viviam na extrema pobreza, um aumento de quase 50% em relação
ao ano anterior.
O Banco Mundial considera que está na extrema pobreza quem vive com até R$ 168 por mês.
O IBGE constatou que a distância que separa os mais ricos dos mais pobres cresceu, atingindo
o segundo maior patamar da série.
Se você vive com um salário mínimo cravado, provavelmente você faz parte da metade mais
pobre da população.
Um país no qual o mínimo continua sendo uma importante ferramenta de combate à pobreza
e à desigualdade.
Nas famílias de baixa renda, se a gente somar o peso que tem alimentação, habitação,
transporte, praticamente 80% da despesa é de uma família de baixa renda.
O salário mínimo historicamente foi evoluindo de uma política simplesmente vinculada à
subsistência e a uma cesta de consumo, básica de consumo, para também uma política de
combate à desigualdade, dando um patamar mínimo de remuneração ao mercado de trabalho.
É nesse espírito que o governo Lula enviou ao Congresso um projeto para tornar permanente
a regra de reajuste anual acima da inflação e com uma promessa para 2026.
Para que esta conquista seja permanente e o salário mínimo volte a ser reajustado
todos os anos acima da inflação, como acontecia quando governamos o Brasil.
Esteja certo de que até o fim do meu mandato ele voltará a ser um grande instrumento de
transformação social que foi no passado, foi graças a isso que milhões de brasileiros
e brasileiras saíram da extrema pobreza e abriram caminho para uma vida melhor.
Da redação do G1, eu sou Natuzaneri e o assunto hoje é a política de valorização
do salário mínimo.
Quais os efeitos da proposta feita pelo governo Lula?
Neste episódio, eu converso com Clara Brenck, doutora em economia pela New School em Nova
York e pesquisadora associada do Centro de Pesquisa em Macroeconomia das Desigualdades
da USP.
Segunda-feira, 8 de maio.
Clara, pode começar contando qual é o principal impacto da proposta do governo de reajustar
todo ano o salário mínimo acima da inflação?
E falando especificamente sobre as classes mais baixas, qual pode ser o efeito dessa
política?
O efeito mais direto de uma política de valorização do salário mínimo acima da inflação é
o de realmente reduzir desigualdades do mercado de trabalho.
Você tem que o salário mínimo é a base do mercado de trabalho formal, então quando
você aumenta esse valor, não necessariamente o topo da distribuição de salários também
vai aumentar na mesma proporção.
Então você tem de aproximar essa base das pessoas que estão recebendo salários um
pouco mais altos e você reduz essa desigualdade dentro do mercado de trabalho formal.
Segundo o Diese, o salário mínimo necessário hoje seria de R$ 6.571.
Levantamento do órgão mostra que o valor atual, de R$ 1.320, compra uma cesta básica
e meia.
Em 2018, o mínimo pagava pouco mais de duas cestas.
Está bem difícil.
Cada vez que a gente vai ao mercado as coisas estão cada vez mais caras.
No Brasil, o salário mínimo tem ainda um efeito adicional porque vários dos benefícios
que o próprio governo tem, como benefícios previdenciários e o benefício de prestação
continuada, o BPC, são baseados no salário mínimo.
Então quando você aumenta o valor do salário mínimo, você também aumenta o valor em
termos reais, acima da inflação, dessas transferências governamentais, que tem sim
um efeito muito importante na redução da desigualdade, não só no mercado de trabalho,
mas na economia como um todo.
Para receber o Bolsa Família, é preciso manter o Cadastro Único atualizado.
O Brasil tem hoje quase 41 milhões de famílias inscritas no CadÚnico e que são elegíveis
para o programa.
O governo federal usa o cadastro para identificar as famílias de baixa renda, público-alvo
das políticas sociais.
O governo federal começou a pagar hoje o Bolsa Família com valor adicional de R$ 150
para as famílias com crianças de 0 a 6 anos.
Mais de 21 milhões de famílias vão receber o benefício.
Desse total, 700 mil são novas dentro do programa, que segundo o governo federal, vai
desembolsar o maior volume médio da história, R$ 14 bilhões em março.
O presidente Lula assinou uma medida provisória que recriou o programa Minha Casa Minha Vida.
E a proposta é que 2 milhões de unidades residenciais sejam entregues até 2026.
Puxando por esse gancho, pesquisas mostram que nos primeiros mandatos de Lula foi possível
reduzir a desigualdade social reajustando o salário mínimo acima da inflação.
Como isso já foi tema das suas pesquisas, pode nos relembrar quais foram os efeitos
na prática?
Sim, grande parte desses efeitos são justamente relacionados a esses dois mecanismos, né?
Digamos assim, tem estudos que mostram que essa valorização do salário mínimo foi
responsável por até 70% da redução do índice de Gini, por exemplo, que a gente
viu entre 1995 e 2014, mas essa parte do mercado do trabalho é 44% da redução do Gini.
Então essa segunda parte do efeito via transferências governamentais e benefícios também aparece
como uma parte importante dessa valorização do salário mínimo.
Agora, um outro ponto importante, Clara, eu gostaria de olhar com você sob um aspecto.
As taxas de desemprego no Brasil estão na casa dos 8%, são cerca de 9 milhões de pessoas
desocupadas.
Enquanto isso, o número de informais está em cerca de 38 milhões de brasileiros e brasileiras.
Na sua avaliação, ter uma política de reajuste permanente do mínimo, da forma que está
sendo pensado, pode ter efeitos negativos como a redução da contratação formal?
Esse efeito é um efeito que pode acontecer, né?
A depender do modo como a economia como um todo vai reagir a esse aumento do salário
mínimo.
Aqui no Brasil o governo mandou hoje para o Congresso Nacional um projeto de lei com
a nova política de valorização do salário mínimo.
Esse projeto prevê que o reajuste do mínimo leve em conta dois itens, índice nacional
de preços ao consumidor do ano anterior e o PIB, que é a soma de toda a riqueza produzida
pelo país de dois anos antes.
Se aprovada pelos parlamentares, a nova regra de correção do mínimo entra em vigor a
partir do ano que vem.
Inicialmente, né, se pensa que, bom, o salário mínimo representa um aumento de custo para
aqueles que estão contratando e justamente para aqueles que estão contratando de maneira
formal, né?
Mas, como a gente acabou de falar, é possível sim que você tenha aumentos de salário mínimo
e aumentos de emprego formal, como se teve pelo menos até 2014, né, no Brasil.
A geração de empregos bateu recorde.
O número de vagas com carteira assinada em 2010 passou de 2 milhões e meio.
Melhor resultado desde o início da série histórica, há 18 anos.
Nós temos aqui vários sinais concretos na economia brasileira de que o mercado de
trabalho está bom, está muito bom.
Primeiro, a taxa de desemprego do IBGE nunca foi tão baixa, está em 5%.
Segundo, os sindicatos têm comemorado que os reajustes salariais têm sido na base de
10%.
Então, não necessariamente isso vem junto com o aumento de emprego informal ou com o
aumento de desemprego.
O salário mínimo pode também ser entendido como uma base de salário para aqueles que
também são informais, não só os formais.
Então, se um trabalhador vê que o salário mínimo aumentou, ele pode achar que vale
a pena entrar no mercado formal, que talvez ele tenha que reduzir um pouco o seu salário
que ele pode ter de maneira informal, mas aí garantir os benefícios.
Um salário mínimo maior pode fazer com que isso valha a pena.
E o mais importante, na verdade, para saber a equação, o resultado dessa equação,
é que justamente os postos de trabalho formal estejam aumentando.
Isso vai acontecer se a economia estiver crescendo.
Então, ainda que os custos das empresas aumentem com o aumento do salário mínimo real, se
as vendas, se a economia está crescendo, elas podem decidir ainda sim contratar mais pessoas.
Então, se os postos de trabalho formal aumentarem significativamente, você pode ter sim aumento
de salário mínimo com aumento de emprego formal.
Espero um instante que eu já volto para continuar minha conversa com a Clara.
Então eu queria entender quais são as medidas que podem ser adotadas para evitar esse potencial
efeito negativo.
Você teria que ter medidas de expansão econômica, né?
Então, por exemplo, você ter algum tipo de incentivo a investimento, abaixar a taxa
de juros, por exemplo, que é uma discussão também atual no Brasil.
O Comitê de Política Monetária do Banco Central manteve a taxa básica de juros em
13,75% ao ano pela sexta vez seguida.
O Copom voltou a avaliar que a inflação ao consumidor segue pressionada e que o ambiente
externo continua diverso.
Também afirmou que a apresentação pelo governo federal da proposta de nova regra
de controle de gastos reduziu as incertezas, mas avaliou que não existe uma relação
mecânica entre inflação sob controle e a aprovação do arcabouço fiscal.
O Copom também declarou que, apesar de ser um cenário menos provável, não vai hesitar
em voltar a subir os juros se for preciso.
Eu não vou ficar brigando com o presidente do Banco Central.
Só posso dizer para vocês, essa taxa de juros é incompreensível para o desenvolvimento
do país.
Você pode ter também aumento de gastos do governo em si.
Na minha tese de mestrado, eu discuto o fato de que o programa Bolsa Família em si foi
também importante para gerar esse mecanismo positivo de retroalimentação entre valorização
do salário mínimo e aumento de emprego formal, porque também transferência via
o programa Bolsa Família gera renda e gera demanda, que gera aumentos de venda.
Então, o mais importante é você ter medidas adicionais que estimulem a economia para justamente
aparecerem esses novos postos de trabalho formal.
Você citou o aumento do poder de compra das pessoas como um dos efeitos da valorização
do salário mínimo.
Dá então para concluir que essa política afeta a economia como um todo?
Pode falar um pouco mais sobre isso?
A princípio, pensando que o aumento do poder de compra das famílias vai gerar um aumento
de vendas para as lojas, porque essas famílias que recebem um salário mínimo ou que recebem
os benefícios do governo são famílias de mais baixa renda, que ainda têm que aumentar
o consumo em alguma medida.
Elas ainda precisam fazer alguma melhoria em casa ou comprar um eletrodoméstico que
não tem ou mudar a qualidade dos produtos que elas compram.
Então, isso vai gerar maior consumo e, consequentemente, vai gerar maior vendas.
E aí vem o efeito que a gente chama de multiplicador.
Ao gerar maiores vendas, também gera maior renda para os supermercados, para as lojas.
Isso vai gerar mais consumo ainda desses funcionários dessas lojas e aí você tem esse efeito
multiplicado.
Então, essa transferência de renda adicional, você tem o efeito de aumentar a renda mais
do que proporcional na economia normalmente.
Esse é o efeito puro, mas o efeito final na economia vai depender de como os outros
agentes reagem.
Então, o governo aumentar salário mínimo quer dizer um aumento de gasto para o governo
também.
Então, será que ele vai aumentar imposto para contrabalancear isso?
Isso pode fazer com que retraia um pouco o consumo.
Será que as firmas vão diminuir o investimento?
Então também pode diminuir a demanda via redução de investimento da firma.
Então, no final, o efeito total depende do balanço final dessas forças.
Se a proposta do Lula for aprovada no Congresso, o impacto pode ser de R$ 15 bilhões no orçamento
da União em 2024.
Então, eu te pergunto, isso pode, de alguma maneira, ser mais um complicador para que o
governo alcance as metas na nova regra fiscal que foi apresentada em março?
Eu diria que não necessariamente um complicador para alcançar a nova meta dada a nova regra
fiscal, se ela for aprovada.
Foi discutido entre o relator do texto, o deputado Cláudio Cajado, e o ministro da
Fazenda, Fernando Haddad, mudanças que a Câmara quer realizar nessa nova regra fiscal,
chamada Orca Bolsa Fiscal.
E uma mudança importante é manter algo que existe hoje na legislação e que o texto
enviado pelo governo tirava, que era a necessidade de fazer contingenciamentos a cada dois meses
quando as receitas do governo não estão correspondendo ao orçamento.
Mas poderia ser um complicador para aumentar investimento em outras áreas que também
são necessárias, né?
Como você falou, 15 bilhões, que é o que tem de estimação de aumento no gasto primário
do governo, representa em torno de 0,8% da despesa do governo sujeita à regra de 2023.
Ou seja, você já teria um aumento de 0,8% nessa despesa, que está limitada pelas projeções
a um aumento de 1,4%.
Então quase que metade do crescimento da despesa já foi comprometido com esse aumento
de salário mínimo.
E aí você teria também que ter aumento, por exemplo, em saúde, investimento em saúde,
em educação, em outras áreas que são importantes, tanto para o crescimento quanto para a distribuição
de renda, que a gente enfatiza muito no MAD, e que talvez fiquem sem espaço, digamos assim,
dentro da nova regra.
Lara, muito obrigada pelas suas explicações.
Já está convidada para voltar outras vezes aqui no assunto.
Eu que agradeço.
Muito obrigada.
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Eu sou Natuzaneri e fico por aqui.
Até o próximo Assunto.
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