Por que Brasil foi exemplo na vacinação contra H1N1 e hoje patina contra covid-19
O Brasil é um exemplo na vacinação contra a pandemia.
A gente já bateu a meta e imunizamos mais de 88
milhões de pessoas.
Mas só deu para fazer isso porque a maioria
das doses necessárias já estavam nas mãos do governo federal quando a campanha começou.
O governo, aliás, fechou acordos para comprar
três imunizantes e lançou uma campanha contra as fakes news sobre a vacina.
O resultado: 45% da população já está
protegida.
Nenhum lugar do mundo vacinou tanto quanto
aqui.
Era assim que a gente estava em junho de 2010,
três meses depois do começo da vacinação contra a gripe suína.
Essa doença é causada por uma variante do
vírus H1N1 e causou uma pandemia entre 2009 e 2010.
A situação mudou bastante em comparação
com o que a gente está vivendo hoje - e não foi pra melhor.
Eu sou Rafael Barifouse, repórter da BBC
News Brasil em São Paulo, e neste vídeo explico por que a gente teve a melhor vacinação
do mundo lá atrás contra o H1N1 e está patinando agora contra a covid-19.
Para vocês terem uma ideia da diferença
entre o Brasil de hoje e o que a gente fez na década passada.
A gente chegou aos três meses de vacinação
contra a covid em 17 de abril.
Pouco mais de 25 milhões de pessoas tinham
sido vacinadas com ao menos uma dose.
Isso representa só 12% da população,
quase quatro vezes menos do que em 2010.
E ainda menos gente tinha tomado as duas doses
que são necessárias, só 4%.
O problema é ainda pior porque continuamos
a avançar bem devagar desde então.
É como me disse a imunologista Cristina Bonorino:
Ela e outros especialistas com quem eu conversei
foram unânimes sobre o motivo disso.
Falta vacina.
O médico Renato Kfouri acredita que se não
fosse por isso a gente poderia estar bem melhor e ter vacinado até mais gente em comparação
com o H1N1, porque o coronavírus é mais perigoso e isso incentiva as pessoas a se imunizarem.
A gente não pode deixar de levar em consideração
que essa vacinação é mais complexa do que a outra, como me explicou a epidemiologista Carla Domingues.
São duas doses em vez de uma, e as regras
de aplicação das vacinas variam.
Mesmo assim, ela considera lamentável a situação
do país desta vez.
A Carla Domingues coordenou o programa nacional
de imunização por nove anos e diz que, com essa estrutura de vacina que o Brasil tem,
nosso desempenho poderia ser muito melhor.
Mas por que falta vacina?
De novo, todos os três especialistas têm
a mesma opinião.
É uma consequência de decisões do governo
de Jair Bolsonaro - isso aliás está sendo investigado por uma CPI nesse momento.
Em resumo, o governo federal não comprou
vacina quando deveria ter feito isso e, quando comprou, não diversificou.
O governo apostou por muito tempo em uma única
vacina, a que é feita pela AstraZeneca e a Universidade de Oxford.
Bolsonaro se recusou a comprar doses da CoronaVac,
vacina criada pela chinesa Sinovac com o Instituto Butantan.
O Butantan está sob a alçada do governo
de São Paulo, e Bolsonaro é adversário político do governador paulista, João Doria,
do PSDB.
Bolsonaro inclusive desautorizou a compra
de milhões de doses que tinha sido acordada pelo general Eduardo Pazuello,
o ministro da Saúde na época.
E essas vacinas servirão para nós iniciarmos a vacinação ainda em janeiro.
Essa era a nossa grande novidade.
Ele tem um protocolo de intenções.
Já mandei cancelar, se ele assinou, já mandei cancelar, o presidente sou eu,
não abro mão da minha autoridade
Até porque estaria comprando uma vacina que ninguém está interessado por ela, a não ser nós.
O governo brasileiro também não quis comprar milhões de doses da vacina da Pfizer.
E fez o menor pedido possível à Covax Facility,
uma aliança liderada pela Organização Mundial de Saúde para levar vacinas contra a covid
aos países mais pobres.
O governo brasileiro tinha uma opção de encomendar
doses suficientes para até 50% da população, mas quis só 10%.
Aí a vacina de Oxford atrasou.
Erros na pesquisa obrigaram os cientistas
a fazer mais testes, e a AstraZeneca teve — e ainda tem — dificuldades para produzir
o que prometeu.
O governo Bolsonaro acabou fechando um acordo
com o Butantan e com a Pfizer, além e outras fabricantes, mas já tinha perdido um tempo
importantíssimo.
O governo federal agiu de forma bem diferente
uma década atrás.
O Ministério da Saúde anunciou a compra
da primeira vacina dois meses depois da OMS declarar a pandemia.
Isso só foi possível porque já havia vacinas
contra a gripe comum, e os laboratórios só precisaram desenvolver versões que protegessem
contra a gripe suína.
O Brasil fechou acordos para comprar mais
de 100 milhões de doses das farmacêuticas Sanofi, GSK e da OMS.
O governo federal esperou até que a maioria
dessas vacinas estivesse em suas mãos para dar início à vacinação, que começou em
março de 2010.
As doses que faltavam chegaram ao longo da
campanha.
A epidemiologista Carla Domingues diz que
outra diferença naquela campanha foi que todo o calendário foi divulgado meses antes da
primeira vacina ser aplicada.
Desta vez....
A vacina vai começar no "dia D", na "hora H".
No "dia D", na "hora H" no Brasil
Em 2010, os grupos de risco sabiam quando seriam imunizados.
As pessoas entenderam e esperaram a sua vez.
Não teve gente tentando furar a fila ou viajando
para outras cidades, estados ou até países para se vacinar.
Outra diferença foi a forma como o governo
federal lidou com as mentiras que são ditas sobre as vacinas.
No ano passado, quando essa doença surge, não tinha… nós trabalhamos com as ferramentas disponíveis no campo da saúde pública.
Vigilância sanitária, epidemiológica, contenção, atenção, diagnóstico, tratamento.
Mas agora, nós temos uma arma nova: a vacina. Uma vacina segura, eficaz e que protege.
E isso vai fazer, com certeza, toda a diferença.
O Ministério da Saúde disse na época do H1N1 que esses boatos eram "irresponsáveis".
E lançou uma campanha para esclarecer que
a vacina não causava autismo, paralisia, alergias fatais, problemas neurológicos
malformação do feto, entre outras coisas.
Não houve nenhum esforço deste tipo agora
- pelo contrário.
O próprio Bolsonaro já questionou a segurança
e a eficácia das vacinas em mais de uma ocasião.
Está bem claro lá no contrato: “Nós não nos responsabilizamos por qualquer efeito colateral.”
Se você virar um jacaré, é problema de
você, pô!
O presidente também já disse várias vezes que não se vacinaria, porque já tinha ficado
doente.
Isso contraria as recomendações das principais
autoridades no assunto.
Até hoje, a campanha contra o H1N1 foi a
maior vacinação na história do Brasil.
E a imunização contra a covid pode muito
bem superar essa marca.
O governo brasileiro diz que já comprou mais
de 560 milhões de doses e diz que elas vão ser entregues até o final do ano.
O problema, segundo os especialistas, diante de
tudo que aconteceu na campanha até agora, é que não dá pra confiar que essas vacinas vão
mesmo chegar.
E você, o que que você acha?
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Até a próxima, tchau!