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PODCAST Português (*Generated Transcript*), POR QUE A EDUCAÇÃO BRASILEIRA É UMA DAS PIORES

POR QUE A EDUCAÇÃO BRASILEIRA É UMA DAS PIORES

Boa noite a todos, sejam bem-vindos. Estamos continuando o que nós começamos ontem.

Nós estamos recebendo convidados especiais para poder conversar sobre o novo projeto da Brasil Paralelo,

que se chama Travessia. Vou conversar agora com o professor Carlos Nadalim.

A minha primeira pergunta, professor, é... gostaria que o senhor se apresentasse.

Acredito que muitos dos que estão aqui podem não te conhecer, não conhecer a sua trajetória.

Gostaria que o senhor partilhasse um pouco conosco de como é que foi o seu caminho na educação.

Muito bem. Bom, eu sou casado, pai de três filhos, graduado em Direito pela Universidade Estadual de Londrina,

nessa mesma instituição eu concluí uma pós-graduação em Filosofia Moderna e Contemporânea

e outra em História e Teorias da Arte Moderna e Contemporânea,

e depois ingressei num mestrado em Educação, sou mestre em Educação.

Atuei como professor no Ensino Fundamental II, depois comecei a lecionar no Ensino Superior,

ministrei aulas de Música, Violão e Guitarra, e depois, atuando como coordenador da Escola Mundo do Valor Mágico,

que é uma instituição familiar, eu tive a oportunidade de desenvolver uma abordagem de alfabetização.

E a alfabetização ficou muito conhecida na internet, na época eu divulgava o empenho dos alunos dessa escola

por meio de um canal no YouTube e nas redes sociais, e em seguida então eu comecei a dar mais visibilidade a esse trabalho

por meio do blog Como Educar Seus Filhos, por meio do qual fiquei bastante conhecido, sobretudo no meio conservador.

E em 2018 a Escola Mundo do Valor Mágico foi indicada, graças ao meu trabalho, ao prêmio que é concedido pela Comissão de Educação,

que se chama Darcy Ribeiro, e a escola recebeu esse prêmio, eu tive o privilégio, a honra de representar a escola, então, em Brasília,

e graças ao prêmio que eu recebi, a minha trajetória no âmbito da alfabetização, eu recebi o convite para estruturar a Secretaria de Alfabetização,

isso foi em dezembro de 2018, e em 2019 então assumi a Secretaria como Secretário de Alfabetização.

Perfeito, professor, e com essa trajetória toda e a atuação também na Secretaria de Educação,

como é que o senhor avalia a qualidade da educação brasileira, com toda essa vivência?

Bom, os dados mostram que a situação da educação básica não é nada animador, e foi por essa razão que o governo decidiu criar uma Secretaria específica

para cuidar desse tema, já que a alfabetização no âmbito da educação é um tema muito caro,

uma vez que se uma criança não aprende a ler, ela não vai ler para aprender.

Então, eu estou usando aqui um princípio extraído de um importante estudo internacional, conduzido pela IAA,

eu sei que muitos conhecem o PISA, mas existe o PEARLS, que é um estudo que avalia a capacidade de compreensão textual de crianças entre 9 e 10 anos,

e nesse estudo fica muito claro que entre 9 e 10 anos as crianças precisam concluir a aprendizagem da leitura.

A alfabetização é uma coisa, a conclusão da aprendizagem da leitura é outra, mas o ciclo de alfabetização é fundamental para que isso aconteça, certo?

Então, o governo, analisando a fonte, a raiz de todos os problemas, cria uma Secretaria para se dedicar a esse tema.

Isso não significa que antigamente o Ministério da Educação não cuidava desse assunto, pelo contrário,

era um assunto tratado pela Secretaria de Educação básica, mas na gestão de 2019 foi decidido que

seria importante criar uma Secretaria específica para tratar do tema.

Então, a Secretaria de Alfabetização foi instituída em 2019 e tinha como principal missão melhorar a qualidade da alfabetização de crianças, jovens e adultos.

Isso aqui é algo importante de ser destacado, já que nós temos as metas no PNE, que é o Plano Nacional de Educação, na meta 5,

você tem uma previsão de quando as crianças devem concluir o ciclo de alfabetização e a meta 9, que trata a alfabetização de jovens e adultos,

do combate ao analfabetismo absoluto e funcional. Então, a Secretaria de Alfabetização tratava desses assuntos.

Davilha, professor, nesse cenário, na sua visão, o que a gente pode pensar de mudanças na formação de professores,

na formação dos alunos, para caminhar numa boa direção da educação?

Bom, vamos lá. Eu vou repetir aqui algo que a doutora Ilona tem destacado, né, em várias entrevistas, e algo que eu tive contato,

sobretudo, acompanhando o trabalho do ex-ministro de Estado da Educação de Portugal, Nuno Gratto.

Então, em 2019, nós convidamos o ministro Nuno, que ministrou uma palestra no seio do Ministério da Educação,

falando sobre o que, na literatura, nós conhecemos como conceito de eficácia escolar.

Então, em todos os países que melhoraram a qualidade educacional, o que, em geral, se constata?

Que, primeiro, há uma elaboração de um currículo muito robusto, muito estruturado, com metas muito claras e ambiciosas, certo?

Então, há um detalhamento dos objetivos curriculares.

Num segundo momento, você elabora materiais didáticos estruturados para os alunos,

e também manuais de orientação para os professores que vão utilizar esses materiais com os alunos.

Esses materiais decoem do currículo. O currículo é a raiz da árvore educacional, certo? De uma árvore saudável.

Então, num terceiro momento, pensamos, então, na formação dos docentes,

que vão utilizar esses materiais e precisam se apropriar dos objetivos curriculares.

Então, respondendo a sua pergunta, uma das pernas do conceito de eficácia escolar é a formação de professores

que precisa estar ancorada num currículo ambicioso.

E, por fim, nós temos o sistema de monitoramento, que são os instrumentos de avaliação

para diagnosticarmos a situação dos alunos, acompanharmos a trajetória escolar das crianças,

a fim de saber se elas estão atingindo os objetivos, atingindo ou não os objetivos curriculares.

Então, são esses os quatro pilares de uma boa educação.

E a formação de professores precisa ser entendida dentro desse contexto, nesse contexto.

Certo? Então, o dinamismo didático...

Retomar os quatro pilares para quem está nos ouvindo.

Oi? Perdão?

Vamos retomar os quatro pilares para quem está nos ouvindo, para ficar bem didático.

Currículo, que precisa ser ambicioso, precisa ter metas claras.

Os materiais decorrentes do currículo, manuais para alunos e professores.

A formação de docentes, que pode ser continuada.

Eu vou dar exemplos aqui do que fizemos na Secretaria de Alfabetização nesse sentido.

E o sistema de monitoramento, ou seja, os instrumentos de avaliação,

para aferir o impacto do uso dos materiais, da robustez curricular e da própria formação dos professores.

O professor citou a doutora Ilona Bettinger-Razi.

Vitor, eu lembro a audiência que nós temos uma entrevista com ela, no Sabatina,

e que ela inclusive detalha bastante desses quatro pilares para se chegar

num resultado melhor da educação, vale a pena, para quem se interessa pelo assunto.

Professor, só um complemento.

A doutora Ilona tem falado sobre isso, no Nucrato.

Eu já tinha ciência dessa realidade antes de entrar no Ministério,

mas isso foi, vamos dizer assim, intensificado, com a participação da doutora Ilona,

nos debates que ela travava pela rádio, falando sobre educação,

com minha aproximação ao trabalho do Nucrato.

Mas uma coisa é entender conceitualmente tudo isso,

outra é você transformar em política pública, certo?

Então, até a minha participação na iniciativa Travesia tem como propósito

mostrar que é possível, levando em consideração as evidências científicas

e um conjunto de dados, converter tudo isso em políticas que cheguem ao chão da escola

e auxiliem efetivamente os professores e os alunos,

que são a prioridade educacional, sobretudo crianças pequenas.

Enfim.

Professor, um outro tema que está muito quente em relação ao que pode ser feito,

o que deve ser feito em relação à educação é a reforma do ensino médio.

Foi uma medida aprovada ainda no governo Temer, se não me engano,

está em processo de implementação, o governo atual parece que está tentando travar isso,

não ir adiante com isso.

O senhor tem alguma opinião formada sobre esse assunto?

Que benefício ou risco isso pode trazer?

Olha, eu prefiro não opinar sobre esse assunto,

porque eu trato de um tema muito específico dentro da educação básica.

Então, a educação básica é dividida em educação infantil, ensino fundamental, ensino médio,

e nós temos dentro da educação infantil a creche, a escola,

dentro do fundamental, o fundamental 1, que vai do primeiro aos 5 anos,

o 2, do sexto ao nome, e depois o ensino médio.

Então, eu concentro meus estudos no âmbito da educação infantil e o ensino fundamental.

Então, eu arrisco palpites nessas áreas.

Então, prefiro não comentar a respeito desse assunto.

Maravilha, professor.

Na educação básica, tem crescido também os recursos tecnológicos,

como um auxílio para os alunos, um auxílio para os professores, um auxílio para os pais.

Na Brasil Paralelo, a gente acredita nessa formação livre,

a gente promove os cursos para que as pessoas façam de casa, façam online,

possam ter na palma da mão o acesso ao conhecimento.

E como o senhor está imerso nesse mundo da educação básica,

gostaríamos de te ouvir falar sobre essa união da tecnologia com a educação,

se isso realmente tem ajudado o país hoje.

Olha, isso veio para ficar, sobretudo depois do período pandêmico.

Então, nós temos esses modelos híbridos, em que você tem aulas presenciais,

aulas online e, no âmbito da educação básica, eu posso aqui citar um exemplo de sucesso,

que foi o lançamento do Grafogame, que é um aplicativo finlandês,

que foi adaptado pela primeira vez ao português do Brasil,

já existia uma versão em Portugal, e nós disponibilizamos,

nós não, o governo federal disponibilizou esse aplicativo gratuitamente,

como uma ferramenta de apoio ao ciclo de alfabetização.

Então, é um aplicativo, é uma ferramenta tecnológica, educacional,

que é testada a pesquisa científica sobre o uso dessa tecnologia,

e durante a nossa gestão, nós acompanhamos vários resultados do uso dessa ferramenta.

Então, de um lado, fornecíamos formação online para os profissionais da alfabetização,

e, de outro lado, também disponibilizamos essa ferramenta

que não substitui a atuação do professor em sala de aula,

sobretudo no período de alfabetização.

Uma coisa é uma criança que está aprendendo a ler, utilizar uma tecnologia de apoio,

outra coisa são crianças que já sabem ler assistindo a aulas pela internet.

Então, no ciclo de alfabetização, o professor é indispensável,

a presença do professor em sala de aula é indispensável, né?

Mas nós não podemos nos esquecer que há ferramentas que possuem evidências científicas

que dão sustentação a elas, certo?

Então, essa, às vezes, essa demonização da tecnologia é algo meio perigoso,

eu vejo muito esse discurso de que as crianças devem ficar afastadas dos monitores, telas,

a realidade, os pediatras estão aí para comprovar isso,

mas você pode usar determinadas ferramentas tecnológicas com moderação.

Por exemplo, nós recomendávamos que o GrafoGame fosse utilizado diariamente

de 10 a 15 minutos, e as crianças precisavam estar acompanhadas de um adulto, certo?

Então, há formas e formas de se utilizar a tecnologia,

eu costumo até brincar sempre, né?

O pessoal que condena o uso de telas, muitas vezes, transmite essa informação

usando um aplicativo, um celular, para outro que recebe por meio de outro aplicativo,

então, espera lá, gente, nós estamos num mundo digital, só precisamos ter moderação, ok?

Então, o GrafoGame foi o aplicativo mais baixado no mundo,

considerando os países que disponibilizaram essa ferramenta, né?

E o número de downloads, se não me engano, foram mais de 1.8, 1.6 milhão de downloads

do GrafoGame.

Então, eu vi várias crianças que aprenderam a ler suas primeiras palavras

usando essa ferramenta.

Mas esse não era o propósito do GrafoGame, o GrafoGame está aí para apoiar

no processo de alfabetização, né?

Até tem um guia que nós disponibilizamos que fala sobre isso, né?

Que o jogo deve ser usado como um apoio, que não descartaria a presença do professor

em sala de aula.

Então, essa combinação da formação dos professores, uma formação baseada

em ciências científicas, com um aplicativo que é acompanhado por uma comunidade acadêmica

do mundo afora, né?

Fez com que várias crianças aprendessem a ler.

Ontem mesmo, eu sem querer vi aqui nas redes sociais,

crianças jogando o GrafoGame no município de Capim Branco.

Eu não sei se vocês assistiram ao documentário que foi feito em Capim Branco

sobre a implementação dos programas da Secretaria de Alfabetização

na rede de ensino.

É um negócio, assim, espetacular.

Porque são crianças...

Eu fico até emocionado porque eu estive lá e eu vi crianças que voltaram do período, né?

Da pandemia, que não passaram pela pré-escola e que, por meio das ações

da Secretaria de Alfabetização, aprenderam a ler com muito mais facilidade.

Eu tive o privilégio de acompanhar o testemunho de uma professora

com mais de 20 anos de experiência em alfabetização,

uma professora realmente muito experiente, nós não podemos desconsiderar

a experiência de nossos professores em sala de aula, né?

Onde tudo acontece.

E ela diz, o programa Tempo de Aprender, da Secretaria de Alfabetização,

me desconstruiu, né?

Eu passei a usar as atividades das formações e, em pouco tempo,

vi resultados em minha turma, levando em consideração o seguinte,

ela recebeu crianças que não tinham passado pela pré-escola,

porque estavam retornando do período de pandemia.

Então, veja, em poucos meses, eles conseguiram resultados brilhantes,

e hoje o município dá continuidade a essas ações, envolvendo as famílias,

estabelecendo uma relação muito estreita entre família e escola,

por meio das ações que foram disponibilizadas pela Secretaria de Alfabetização.

Professor, o senhor acha que a tecnologia também pode ajudar

para quem opta pelo homeschooling?

E, de uma forma geral, o que o senhor acha dessa alternativa também

para a educação, principalmente para os mais jovens, né?

Para a educação básica?

Sobre educação no dia a dia?

A pergunta?

Exato.

Eu tenho alguns dados aqui para a gente refletir um pouquinho

sobre educação básica.

Nós temos hoje no Brasil 47 milhões de matrículas na educação básica.

Dessas 47 milhões de matrículas, 38 estão na rede pública de ensino.

Então, a educação domiciliar é uma alternativa, tá certo?

Ela deve ser defendida mais em função do que?

Do direito, da liberdade que os pais têm de instruírem seus filhos

da forma que considerarem mais adequada.

Porém, nós temos aqui na educação básica que dar prioridade

à rede pública de ensino pelos números.

Porque, veja só, você vai educar seu filho em casa, ok?

Acho que todos devem ter o direito de escolher qual é a melhor modalidade

a ser adotada para instruir seus filhos, né?

Mas lá, depois do ensino médio, o que vai acontecer?

Um encontro daquelas crianças que estavam na rede pública,

seja na rede privada, na educação básica, né?

Seja na rede privada ou pública, com essas que foram educadas em casa.

Então, eu sempre, assim, depois de minha experiência no Ministério da Educação,

eu sempre falo o seguinte, as políticas públicas e educacionais

voltadas à rede pública de ensino, elas influenciam a educação privada.

Isso é algo, para mim, muito claro, tá?

Então, nós precisamos trabalhar em várias frentes e priorizar a rede pública.

Diante desses números, não há outra escolha, né?

Então, a minha visão é essa, nós precisamos melhorar a qualidade da educação básica no Brasil, né?

E também, né, defender a liberdade dos pais que optam por instruir seus filhos em casa.

Mas, veja, uma coisa é a luta pela melhoria da qualidade educacional.

Outra coisa, apresentar uma modalidade de ensino como solução para esse problema.

É evidente que essa modalidade é importante, é positiva para os pais que fazem uso dela.

Mas a discussão que eu vejo, assim, é uma confusão, muitas vezes,

de, olha, diante do quadro da educação brasileira, vamos instruir nossos filhos em casa.

Tá entendendo?

Então, assim, eu, até como católico, acho que isso chega a ser uma falta de caridade cristã.

Basta visitar escolas públicas, crianças que, muitas vezes,

fazem suas principais alimentações durante o período escolar,

pra você começar a mudar um pouco de opinião sobre o que é prioridade em educação.

Ok?

Então, essa é a minha visão.

Essas famílias precisam, sim, ter o direito de escolher a modalidade que consideram mais,

a modalidade educacional que consideram mais adequadas,

mas nós precisamos priorizar a rede pública de ensino,

porque nós temos ali uma concentração de matrículas, um número expressivo de matrículas.

Educando em casa, por meio da educação domiciliar,

ou recorrendo ao ensino público, ao ensino privado, onde quer que se eduque,

como é que a gente pode incentivar e melhorar a relação pais e filhos?

A presença dos pais na educação dos filhos, o interesse dos pais pela educação dos filhos?

Vamos lá.

Eu vou até retomar um pouco esse tema, que é interessante.

Existe na literatura um conceito de capital familiar para aprendizagem.

O que significa isso?

É um conjunto de variáveis responsáveis por certos preditores de desempenho no ensino formal.

Então, por exemplo, crianças, oriundos, de famílias,

cujos pais possuem uma qualificação profissional, ensino superior,

possuem muitos livros, sobretudo livros de literatura infantil,

e também materiais de apoio pedagógico,

essas crianças têm um desempenho superior lá no quarto ano do ensino fundamental.

Estou falando de crianças na primeira infância, tá?

Então, crianças que na primeira infância receberam estimulação de famílias

que possuem essas características, tendem a ter sucesso escolar, ok?

Então, veja, você precisa, no ambiente escolar, aliar dois universos.

Primeiro, analisar as crianças que possuem um elevado capital familiar para aprendizagem

e aquelas que não possuem um capital tão elevado.

E, de outro lado, o que as pesquisas mostram?

O que mais conta para o sucesso escolar é a apropriação dos objetivos curriculares

que são estabelecidos pela escola, por parte do corpo docente, dos coordenadores

e também dos próprios pais, né?

Nesse sentido, o envolvimento das famílias na escola significa o quê?

As famílias, primeiro, tomarem consciência dos objetivos curriculares

e auxiliarem os filhos, no caso, a atingi-los, tá certo?

Então, o que acontece no Brasil?

Muitas vezes, crianças que estão matriculadas, sei lá, na rede privada

têm um desempenho escolar X em função do capital familiar para aprendizagem, tá certo?

Então, outras vezes, nós temos uma confusão entre educação domiciliar

e práticas de literacia familiar, que é um outro tema interessantíssimo

para ser explorado. Por quê?

Uma coisa é a educação formal, que é de natureza curricular, ok?

Outra coisa é a orientação informal, que pode ser estruturada ou não estruturada.

Então, os pais de famílias de classe média alta,

que não vivem em situação de vulnerabilidade social,

cultivam certos hábitos que favorecem depois a aprendizagem da leitura, por exemplo, tá certo?

E aí, muitas pessoas confundem a educação formal com a orientação informal estruturada.

São universos distintos, tá certo?

Então, a participação da família é fundamental na educação dos filhos,

não foi à toa que o governo federal lançou o programa Conta Pra Mim,

que é um programa de promoção de práticas de literacia familiar,

ou seja, um programa que incentivava os pais a lerem em voz alta seus filhos,

a melhorarem a qualidade de interação verbal com crianças pequenas,

porque as pesquisas mostram o impacto disso no futuro escolar dessas crianças.

Não sei se vocês já viram algumas das evidências científicas,

há uma que mostra assim, crianças oriundas de famílias pobres, aos quatro anos,

ouviram 30 milhões de palavras a menos do que as de classe média alta.

É evidente que isso tem um impacto no desenvolvimento da linguagem dessas crianças

e na compreensão oral delas.

Em leitura, existe uma fórmula muito básica,

você primeiro desenvolve o vocabulário receptivo,

depois aciona o expressivo por meio do receptivo,

e em seguida aprende a ler e a escrever.

A leitura está para escuta, assim como a fala está para escrita.

Então, um bom leitor é, antes de mais nada, um bom ouvinte,

porque, no fundo, quando você lê um texto, o que acontece?

Você tem ali uma espécie de mapeamento de realidades sonoras da fala.

Então, sabendo ler, você converte aqueles sinais gráficos, símbolos gráficos,

em um episódio de fala.

Então, você se porta como um ouvinte ao ler.

Até acho curioso, muita gente fica romantizando a leitura,

falando que é um ato de meditação, e assim, desculpe-me,

eu sou meio contra romantismo, uns pedagógicos.

Ler é ouvir alguém que está ausente, ponto final.

Então, se você quer formar um bom leitor, você precisa, antes, formar um bom ouvinte.

E esse é um tema que não é debatido no meio conservador.

Fala-se de analfabetismo funcional, querem combater esse problema,

e ninguém discute um tema que é crucial para que isso aconteça,

que é a fluência em leitura oral.

Fala-se em baixa capacidade de compreensão textual,

e ninguém fala sobre compreensão oral, compreensão auditiva.

Por exemplo, tem outra fórmula interessante, no relatório da Câmara.

Compreensão em leitura é igual compreensão oral,

vezes reconhecimento automático de palavras.

É assim que funciona o processo.

Então, quando você faz uma avaliação, fica fácil de constatar

se a criança tem um déficit em decodificação de palavras,

ou em compreensão oral, e aí você faz a intervenção adequada.

Enfim, então...

Se eu entendi bem uma coisa,

quero dizer de uma forma bem resumida para quem está nos ouvindo,

é possível concluir de uma forma resumida, de uma forma ampla,

que as crianças que estiverem sendo criadas em lares

com pais mais habituados ao estudo,

com pais com um vocabulário maior,

com pais que têm livros em casa,

crianças que veem os exemplos de pais que estudam,

essas crianças têm um melhor desenvolvimento na sua própria educação.

Podemos considerar isso?

Sim, a ciência diz isso.

A ciência diz que os pais são os primeiros e principais professores de seus filhos.

Porém, com isso, a ciência não está dizendo

que os pais devem assumir a educação formal das crianças.

Está entendendo?

Isso aí nada mais é do que orientação informal,

que pode ser estruturada ou não estruturada.

O que é a orientação informal?

É uma aculturação pela qual todos nós passamos.

Só que há ambientes que são mais ricos e outros não.

Foi por essa razão que o Ministério da Educação lançou o programa Conta Pra Mim

e estabeleceu uma parceria com o programa Criança Feliz.

Não sei se vocês conhecem.

O programa Criança Feliz é o maior programa de visitação domiciliar do mundo,

que atende crianças, famílias que estão no antigo Auxílio Brasil.

Então, o que aconteceu ali?

Por meio do Conta Pra Mim, nós elaboramos uma formação para os assistentes de alfabetização,

para os visitadores do programa Criança Feliz,

receberam uma formação que foi elaborada pela Secretaria de Alfabetização,

e nessa formação destacávamos a importância das práticas de literacia familiar.

Ou seja, por que os pais precisam contar histórias para os filhos,

por que os pais precisam melhorar a qualidade de interação verbal com as crianças.

Um detalhe importante, as práticas de literacia não estão voltadas apenas a pessoas letradas.

Analfabetos podem melhorar a qualidade de interação verbal com crianças pequenas, sim.

Então, veja, com essa parceria, os assistentes iam até as casas dessas famílias

que vivem em situação de vulnerabilidade social, davam essas instruções,

e levando em consideração a pesquisa que mencionei há pouco

sobre a quantidade de livros infantis em casa,

o governo então distribuiu livros para essas famílias.

Então, veja, que nós priorizamos as famílias que viviam em situação de vulnerabilidade social

e levamos em consideração duas variáveis importantes,

a formação desses pais e também a entrega dos livros infantis.

Então, para quê? Para melhorar o ambiente e aumentar o capital familiar

para a aprendizagem dessas crianças.

É claro que as práticas de literacia geram outras consequências,

como, por exemplo, o fortalecimento dos laços familiares.

Você passa a ler para uma criança, a conversar mais com ela,

evidentemente você tem uma intensificação ali da relação entre adultos e crianças.

Então, nós vimos que por meio dessas práticas nós melhorávamos a linguagem das crianças,

as funções executivas, que é outro tema interessantíssimo,

as crianças precisam calibrar certas funções que são acionadas para aprender qualquer coisa.

Vou dar um exemplo aqui. Controle inibitório.

Você tem um impulso interno e precisa, de certa maneira,

modelá-lo a fim de que você se comporte da forma que se espera em um determinado ambiente.

Então, essas habilidades são trabalhadas na educação formal e também por meio de práticas de literacia

que são conduzidas pelas famílias.

Então, uma coisa é uma família de classe média alta,

que naturalmente acaba promovendo essas estimulações,

outra coisa são as famílias que vivem em situação de vulnerabilidade social.

Lógico que a prioridade do programa eram as famílias que viviam em situação de vulnerabilidade social.

E os visitadores do programa Tempo Criança Feliz abraçaram a conta para mim de uma maneira incrível.

Então, nós ficávamos impressionados com o engajamento desses visitadores.

Eu acompanhei a entrega dos livros e muitas vezes testemunhei crianças que, pela primeira vez,

estavam recebendo em casa um livro de literatura infantil.

O Brasil é um dos países que mais gasta com educação no mundo, proporcionalmente,

mais até do que países da OCDE, mas infelizmente o resultado não vem.

Todos os rankings aí, PISA e outros rankings que avaliam a qualidade da educação,

estão sempre lá embaixo da tabela.

Dá para dizer que o que não falta é dinheiro?

Aqui no Brasil nós não podemos reclamar de faltas de recurso,

mesmo assim a gente vê sempre os políticos dizendo que vão prometer mais recursos,

mais dinheiro para a educação.

É esse o problema?

Como é que a gente sai dessa armadilha de achar que é mais dinheiro que vai resolver?

Valeu, o Nuno Krato respondeu a sua pergunta na palestra que eu mencionei, lá em 2019.

Muito investimento em tecnologia, em infraestrutura, e tem algo que ele diz,

eu até me memorizei, se vocês quiserem, acessem aí, o vídeo está disponível na internet,

a abertura da primeira conferência nacional de alfabetização baseada em evidências.

O Nuno disse algo tão acessível, tão barato, custa tão pouco,

que é a elaboração de um currículo estruturado.

Esse é o começo de tudo.

Ele diz que a educação começa pelo começo e o começo é o currículo.

Então, eu acredito que um investimento, uma reformulação curricular

é fundamental para revertermos o quadro, a situação da educação básica no Brasil.

Nós temos aí a base nacional como curricular, ela não é um currículo,

ela orienta a elaboração de currículos e há uma previsão de revisão desse documento.

Então, levando em consideração países como França, Inglaterra, Portugal e tantos outros,

nós podemos fazer uma comparação entre esses currículos e imitar o que funcionou no mundo afora,

e também aqui no Brasil.

Há municípios que possuem currículos estruturados e têm apresentado um bom desempenho

nas avaliações nacionais.

Então, eu acho que esse é o grande investimento.

Professor, gostaria de uma consideração final sua, respondendo uma coisa simples.

Por que as pessoas deveriam assistir a sua aula dentro da Travessia da Brasil Paralelo?

O que elas podem esperar?

Bom, elas podem esperar uma exposição muito objetiva, recheada com dados

de como a Secretaria de Alfabetização conseguiu converter pesquisas científicas

e tantos outros dados educacionais em políticas públicas e educacionais.

Por quê?

Muitos falam sobre os problemas da educação, e eu acho que o público em geral já está cansado disso.

Nós precisamos de soluções, soluções realistas, atíveis.

E nós, durante quatro anos, conseguimos, por meio do uso de evidências científicas,

converter em ações, em iniciativas, coisas que desejávamos.

Por exemplo, quem aqui já falou que um dos problemas da educação brasileira

é o de alunos que não sabem redigir um texto?

Acredito que a maioria.

Bom, saibam, senhores, que o Ministério da Educação publicou um curso de redação

que é um dos melhores que esse país já viu.

O curso chama-se Práticas de Produção de Textos, disponível gratuitamente

no site do Ministério da Educação.

Quem aqui já não falou sobre o problema do analfabetismo infuncional?

Nós lançamos uma formação que foi elaborada por especialistas portugueses

de altíssimo nível para que nossos jovens e alunos aprendam efetivamente a ler.

Então, eu acho que nós precisamos entender o problema e estudar de que maneira

podemos realmente elaborar instrumentos para atacar o problema.

Eu vejo muitas vezes dados alarmantes, mas e aí?

Qual a solução que você tem para nos apresentar?

Aí vem a pergunta.

Com uma experiência pessoal, querendo replicar isso em escalação.

Isso é uma absurdidade.

Em palestra educacional costuma ser o seguinte.

Tudo isso aí que você está falando que funciona, onde foi que você implementou

e onde estão os dados do impacto disso que você está falando que realmente funciona?

Eu tenho os dados do programa Tempo de Aprender, eles estão disponíveis, são públicos.

As redes que participaram do programa, as crianças que participaram do programa

Tempo de Aprender, a pesquisa mostra que elas têm de 23% a 27% a mais de chances

de concluírem o ciclo de alfabetização e adquirirem a fluência em leitura

que se espera para o segundo ano do que aquelas que não participaram do programa.

Então, isso, nós temos que trabalhar com dados no ambiente educacional.

E é isso que eu apresento na minha exposição, dentro do limite de tempo que eu tinha ali.

Então, eu mostrei assim, aqui estão, isso aqui é educação básica brasileira,

nós temos um problema gravíssimo que é a doença da leitura.

Por que é um problema grave?

É que nós temos os dados das avaliações nacionais, nós temos o reflexo disso no PISA,

o pessoal fala muito sobre o PISA, ENEM, mas não analisa os dados do Saeb, por exemplo.

Nem sabe o que é Saeb, muitas vezes, e tá lá falando mal da educação, falando que é um problema, etc.

Então, eu mostrei tudo isso aqui, o que a ciência diz, mostrei algumas evidências

sobre como ensinar uma criança a ler, um jovem, um adulto, e o que nós fizemos e os resultados, certo?

Então, nós precisamos debater educação, levando em consideração evidências.

O que funcionou, como foi, para podermos replicar as doenças exituosas e melhorarmos essa situação.

Porque, assim, a descrição do problema já tá virando um hit aí que todo mundo tá se cansando de ouvir, certo?

Ah, a educação brasileira vai mal, tal.

Poxa, você realmente está preocupado com esse assunto?

É muito comum ouvir isso sendo repetido.

Se estivesse, apresente as suas propostas.

Nós temos hoje dados de que os programas da Secretaria de Alfabetização funcionaram.

Funcionaram, mudaram a realidade de municípios brasileiros.

Crianças que, pela primeira vez, receberam ali um livro de literatura infantil.

Vou te dar outra, não sei se eu posso falar mais um pouquinho aqui.

Eu concluí a minha apresentação dizendo o seguinte, olha, fujam dos romantismos pedagógicos.

Os romantismos pedagógicos, eles não são uma propriedade exclusiva dos progressistas.

A direita também cultiva vários deles, certo?

Então, assim, o que é o romantismo pedagógico?

É aquele discurso educacional adocicado, entendeu?

Que deixa a plateia toda feliz, mas que não tem impacto nenhum no chão da escola.

E tem detalhes sobre isso na sua aula.

Tem detalhes sobre isso.

Não, eu não dei exemplos lá. Eu só chamei atenção, mas eu posso dar aqui.

Por exemplo, esse estudo que eu mencionei, o PERCS, é o principal estudo para a ferição de compreensão e leitura no 4º ano do ensino fundamental.

Ponto final.

Quem não conhece esse estudo e está falando sobre problemas de compreensão textual não sabe o que está dizendo.

Ali você tem claramente as finalidades de leitura.

Uma que é de você ser capaz de ler textos informativos.

E outra finalidade que é a compreensão de textos ficcionais.

Então tem um domínio dentro desse estudo de avaliação que é a educação literária de crianças.

Só que isso não é tratado de forma romântica.

Como é que eu vou aferir se uma criança realmente está entendendo um texto ficcional?

Bom, ela precisa primeiro demonstrar que é capaz de localizar, extrair uma informação explícita desse texto.

Mas basta isso? Não.

Segunda etapa. Você precisa elaborar itens para saber se ela está fazendo inferências diretas.

Ou seja, relacionando elementos que estão explícitos do texto.

Num terceiro momento ela tem que ser capaz de interpretar o texto.

Muita gente confunde compreensão com interpretação.

Compreensão é você extrair o que está ali.

Interpretação é relacionar conhecimentos prévios que você possui com o que você está lendo.

E a quarta etapa é a emissão de um juízo.

Você analisa, avalia o que foi lido e emite um juízo.

Então, o PORS avalia isso.

Então, ali é uma coisa natural você esperar que uma criança saiba ler obras ficcionais.

Então, você acompanha países europeus, você tem programas de governo com a indicação de obras literárias.

Ligo clássicos, obras que não são muito boas.

Mas ninguém fica romantizando isso.

Falando que você precisa ler o clássico para melhorar o seu caráter, porque você vai ficar mais virtuoso.

Você não vê essas coisas em pesquisas científicas sobre a importância de se ler obras ficcionais.

Você não vai estabelecer um debate sério argumentando dessa maneira.

Você pega os dados do PISA.

Por exemplo, os jovens que liam com mais frequência obras ficcionais tinham um melhor desempenho em compreensão textual do que aqueles que liam revistas, alguns tipos de textos informativos, etc.

Então, isso é um consenso na literatura que não deve ser tratado com romantismos.

Então, por exemplo, tem muito no meio conservador aquilo que eu chamo de tese de transferência.

Eu não, o próprio Nono Kraton.

Ele ministrou uma palestra e ele dá exemplos disso.

Essa promessa de que você vai escutar uma coisa e vai ficar melhor em outra.

Não sei se vocês já viram esse tipo de discurso.

O camarada chega e diz para você assim, olha, aí não é bem transferência, mas é algo análogo.

Olha, dependendo do temperamento de uma criança, esse assunto está em voga aí, né?

Uma coisa curiosa.

Ela vai subtrair ou somar melhor.

Sei lá, se ela for melancólica, ela vai subtrair melhor.

Ou ela vai tornar um passo que, se for colérico, vai somar.

E com relação entre uma coisa e outra, entende?

Então, essas coisas, isso tudo são romantismos pedagógicos.

Por exemplo, você vai aprender a escrever levando em consideração seus gostos pessoais,

a sua experiência literária, etc.

Olha, eu tenho um livro aqui, de um português, que explica, ele mapeia o cérebro e todas,

tudo que é acionado no lado da escrita.

E aí é só você fazer uma avaliação do que ali não está funcionando, para melhorar essas habilidades.

Então, eu concluo minha aula dizendo, olha, cuidado com os romantismos pedagógicos,

porque eles circuntam também no meio conservador, que vive criticando a situação da educação,

e falando que a culpa é de uma ala política, etc.

Mas apresenta como solução para o problema, muitas vezes, né?

Teses que são, por sua vez, também românticas.

Eu tenho certeza de que foi fundamental para todos ouvirem do senhor também a importância da leitura ficcional.

Deixar as crianças terem contato com histórias.

E histórias é o nosso negócio, né, Renato?

Nós também contamos histórias na Brasil Paralelo, contamos histórias brasileiras,

histórias nacionais nos nossos documentários, nos filmes que nós contratamos na nossa plataforma.

Contamos histórias que têm bons valores, boas ideias e bons sentimentos.

Com travessia não seria diferente.

Lá você vai ter uma jornada de estudos que vai aumentar muito a sua bagagem, vai te ajudar na sua casa, na sua família.

Você, pai, você, mãe, que nos acompanhou até agora, invista nos seus estudos e nos seus conhecimentos para poder ajudar os seus filhos, tá bom?

Professor Carlos Nadalim, muito obrigado pela sua presença, uma boa noite.

Renato, boa noite.

Belo papo, Victor, obrigado, professor. Obrigado a todos que acompanharam.


POR QUE A EDUCAÇÃO BRASILEIRA É UMA DAS PIORES WARUM DAS BRASILIANISCHE BILDUNGSWESEN EINES DER SCHLECHTESTEN IST WHY BRAZILIAN EDUCATION IS ONE OF THE WORST POR QUÉ LA EDUCACIÓN BRASILEÑA ES UNA DE LAS PEORES

Boa noite a todos, sejam bem-vindos. Estamos continuando o que nós começamos ontem.

Nós estamos recebendo convidados especiais para poder conversar sobre o novo projeto da Brasil Paralelo,

que se chama Travessia. Vou conversar agora com o professor Carlos Nadalim.

A minha primeira pergunta, professor, é... gostaria que o senhor se apresentasse.

Acredito que muitos dos que estão aqui podem não te conhecer, não conhecer a sua trajetória.

Gostaria que o senhor partilhasse um pouco conosco de como é que foi o seu caminho na educação.

Muito bem. Bom, eu sou casado, pai de três filhos, graduado em Direito pela Universidade Estadual de Londrina,

nessa mesma instituição eu concluí uma pós-graduação em Filosofia Moderna e Contemporânea

e outra em História e Teorias da Arte Moderna e Contemporânea,

e depois ingressei num mestrado em Educação, sou mestre em Educação.

Atuei como professor no Ensino Fundamental II, depois comecei a lecionar no Ensino Superior,

ministrei aulas de Música, Violão e Guitarra, e depois, atuando como coordenador da Escola Mundo do Valor Mágico,

que é uma instituição familiar, eu tive a oportunidade de desenvolver uma abordagem de alfabetização.

E a alfabetização ficou muito conhecida na internet, na época eu divulgava o empenho dos alunos dessa escola

por meio de um canal no YouTube e nas redes sociais, e em seguida então eu comecei a dar mais visibilidade a esse trabalho

por meio do blog Como Educar Seus Filhos, por meio do qual fiquei bastante conhecido, sobretudo no meio conservador.

E em 2018 a Escola Mundo do Valor Mágico foi indicada, graças ao meu trabalho, ao prêmio que é concedido pela Comissão de Educação,

que se chama Darcy Ribeiro, e a escola recebeu esse prêmio, eu tive o privilégio, a honra de representar a escola, então, em Brasília,

e graças ao prêmio que eu recebi, a minha trajetória no âmbito da alfabetização, eu recebi o convite para estruturar a Secretaria de Alfabetização,

isso foi em dezembro de 2018, e em 2019 então assumi a Secretaria como Secretário de Alfabetização.

Perfeito, professor, e com essa trajetória toda e a atuação também na Secretaria de Educação,

como é que o senhor avalia a qualidade da educação brasileira, com toda essa vivência?

Bom, os dados mostram que a situação da educação básica não é nada animador, e foi por essa razão que o governo decidiu criar uma Secretaria específica

para cuidar desse tema, já que a alfabetização no âmbito da educação é um tema muito caro,

uma vez que se uma criança não aprende a ler, ela não vai ler para aprender.

Então, eu estou usando aqui um princípio extraído de um importante estudo internacional, conduzido pela IAA,

eu sei que muitos conhecem o PISA, mas existe o PEARLS, que é um estudo que avalia a capacidade de compreensão textual de crianças entre 9 e 10 anos,

e nesse estudo fica muito claro que entre 9 e 10 anos as crianças precisam concluir a aprendizagem da leitura.

A alfabetização é uma coisa, a conclusão da aprendizagem da leitura é outra, mas o ciclo de alfabetização é fundamental para que isso aconteça, certo?

Então, o governo, analisando a fonte, a raiz de todos os problemas, cria uma Secretaria para se dedicar a esse tema.

Isso não significa que antigamente o Ministério da Educação não cuidava desse assunto, pelo contrário,

era um assunto tratado pela Secretaria de Educação básica, mas na gestão de 2019 foi decidido que

seria importante criar uma Secretaria específica para tratar do tema.

Então, a Secretaria de Alfabetização foi instituída em 2019 e tinha como principal missão melhorar a qualidade da alfabetização de crianças, jovens e adultos.

Isso aqui é algo importante de ser destacado, já que nós temos as metas no PNE, que é o Plano Nacional de Educação, na meta 5,

você tem uma previsão de quando as crianças devem concluir o ciclo de alfabetização e a meta 9, que trata a alfabetização de jovens e adultos,

do combate ao analfabetismo absoluto e funcional. Então, a Secretaria de Alfabetização tratava desses assuntos.

Davilha, professor, nesse cenário, na sua visão, o que a gente pode pensar de mudanças na formação de professores,

na formação dos alunos, para caminhar numa boa direção da educação?

Bom, vamos lá. Eu vou repetir aqui algo que a doutora Ilona tem destacado, né, em várias entrevistas, e algo que eu tive contato,

sobretudo, acompanhando o trabalho do ex-ministro de Estado da Educação de Portugal, Nuno Gratto.

Então, em 2019, nós convidamos o ministro Nuno, que ministrou uma palestra no seio do Ministério da Educação,

falando sobre o que, na literatura, nós conhecemos como conceito de eficácia escolar.

Então, em todos os países que melhoraram a qualidade educacional, o que, em geral, se constata?

Que, primeiro, há uma elaboração de um currículo muito robusto, muito estruturado, com metas muito claras e ambiciosas, certo?

Então, há um detalhamento dos objetivos curriculares.

Num segundo momento, você elabora materiais didáticos estruturados para os alunos,

e também manuais de orientação para os professores que vão utilizar esses materiais com os alunos.

Esses materiais decoem do currículo. O currículo é a raiz da árvore educacional, certo? De uma árvore saudável.

Então, num terceiro momento, pensamos, então, na formação dos docentes,

que vão utilizar esses materiais e precisam se apropriar dos objetivos curriculares.

Então, respondendo a sua pergunta, uma das pernas do conceito de eficácia escolar é a formação de professores

que precisa estar ancorada num currículo ambicioso.

E, por fim, nós temos o sistema de monitoramento, que são os instrumentos de avaliação

para diagnosticarmos a situação dos alunos, acompanharmos a trajetória escolar das crianças,

a fim de saber se elas estão atingindo os objetivos, atingindo ou não os objetivos curriculares.

Então, são esses os quatro pilares de uma boa educação.

E a formação de professores precisa ser entendida dentro desse contexto, nesse contexto.

Certo? Então, o dinamismo didático...

Retomar os quatro pilares para quem está nos ouvindo.

Oi? Perdão?

Vamos retomar os quatro pilares para quem está nos ouvindo, para ficar bem didático.

Currículo, que precisa ser ambicioso, precisa ter metas claras.

Os materiais decorrentes do currículo, manuais para alunos e professores.

A formação de docentes, que pode ser continuada.

Eu vou dar exemplos aqui do que fizemos na Secretaria de Alfabetização nesse sentido.

E o sistema de monitoramento, ou seja, os instrumentos de avaliação,

para aferir o impacto do uso dos materiais, da robustez curricular e da própria formação dos professores.

O professor citou a doutora Ilona Bettinger-Razi.

Vitor, eu lembro a audiência que nós temos uma entrevista com ela, no Sabatina,

e que ela inclusive detalha bastante desses quatro pilares para se chegar

num resultado melhor da educação, vale a pena, para quem se interessa pelo assunto.

Professor, só um complemento.

A doutora Ilona tem falado sobre isso, no Nucrato.

Eu já tinha ciência dessa realidade antes de entrar no Ministério,

mas isso foi, vamos dizer assim, intensificado, com a participação da doutora Ilona,

nos debates que ela travava pela rádio, falando sobre educação,

com minha aproximação ao trabalho do Nucrato.

Mas uma coisa é entender conceitualmente tudo isso,

outra é você transformar em política pública, certo?

Então, até a minha participação na iniciativa Travesia tem como propósito

mostrar que é possível, levando em consideração as evidências científicas

e um conjunto de dados, converter tudo isso em políticas que cheguem ao chão da escola

e auxiliem efetivamente os professores e os alunos,

que são a prioridade educacional, sobretudo crianças pequenas.

Enfim.

Professor, um outro tema que está muito quente em relação ao que pode ser feito,

o que deve ser feito em relação à educação é a reforma do ensino médio.

Foi uma medida aprovada ainda no governo Temer, se não me engano,

está em processo de implementação, o governo atual parece que está tentando travar isso,

não ir adiante com isso.

O senhor tem alguma opinião formada sobre esse assunto?

Que benefício ou risco isso pode trazer?

Olha, eu prefiro não opinar sobre esse assunto,

porque eu trato de um tema muito específico dentro da educação básica.

Então, a educação básica é dividida em educação infantil, ensino fundamental, ensino médio,

e nós temos dentro da educação infantil a creche, a escola,

dentro do fundamental, o fundamental 1, que vai do primeiro aos 5 anos,

o 2, do sexto ao nome, e depois o ensino médio.

Então, eu concentro meus estudos no âmbito da educação infantil e o ensino fundamental.

Então, eu arrisco palpites nessas áreas.

Então, prefiro não comentar a respeito desse assunto.

Maravilha, professor.

Na educação básica, tem crescido também os recursos tecnológicos,

como um auxílio para os alunos, um auxílio para os professores, um auxílio para os pais.

Na Brasil Paralelo, a gente acredita nessa formação livre,

a gente promove os cursos para que as pessoas façam de casa, façam online,

possam ter na palma da mão o acesso ao conhecimento.

E como o senhor está imerso nesse mundo da educação básica,

gostaríamos de te ouvir falar sobre essa união da tecnologia com a educação,

se isso realmente tem ajudado o país hoje.

Olha, isso veio para ficar, sobretudo depois do período pandêmico.

Então, nós temos esses modelos híbridos, em que você tem aulas presenciais,

aulas online e, no âmbito da educação básica, eu posso aqui citar um exemplo de sucesso,

que foi o lançamento do Grafogame, que é um aplicativo finlandês,

que foi adaptado pela primeira vez ao português do Brasil,

já existia uma versão em Portugal, e nós disponibilizamos,

nós não, o governo federal disponibilizou esse aplicativo gratuitamente,

como uma ferramenta de apoio ao ciclo de alfabetização.

Então, é um aplicativo, é uma ferramenta tecnológica, educacional,

que é testada a pesquisa científica sobre o uso dessa tecnologia,

e durante a nossa gestão, nós acompanhamos vários resultados do uso dessa ferramenta.

Então, de um lado, fornecíamos formação online para os profissionais da alfabetização,

e, de outro lado, também disponibilizamos essa ferramenta

que não substitui a atuação do professor em sala de aula,

sobretudo no período de alfabetização.

Uma coisa é uma criança que está aprendendo a ler, utilizar uma tecnologia de apoio,

outra coisa são crianças que já sabem ler assistindo a aulas pela internet.

Então, no ciclo de alfabetização, o professor é indispensável,

a presença do professor em sala de aula é indispensável, né?

Mas nós não podemos nos esquecer que há ferramentas que possuem evidências científicas

que dão sustentação a elas, certo?

Então, essa, às vezes, essa demonização da tecnologia é algo meio perigoso,

eu vejo muito esse discurso de que as crianças devem ficar afastadas dos monitores, telas,

a realidade, os pediatras estão aí para comprovar isso,

mas você pode usar determinadas ferramentas tecnológicas com moderação.

Por exemplo, nós recomendávamos que o GrafoGame fosse utilizado diariamente

de 10 a 15 minutos, e as crianças precisavam estar acompanhadas de um adulto, certo?

Então, há formas e formas de se utilizar a tecnologia,

eu costumo até brincar sempre, né?

O pessoal que condena o uso de telas, muitas vezes, transmite essa informação

usando um aplicativo, um celular, para outro que recebe por meio de outro aplicativo,

então, espera lá, gente, nós estamos num mundo digital, só precisamos ter moderação, ok?

Então, o GrafoGame foi o aplicativo mais baixado no mundo,

considerando os países que disponibilizaram essa ferramenta, né?

E o número de downloads, se não me engano, foram mais de 1.8, 1.6 milhão de downloads

do GrafoGame.

Então, eu vi várias crianças que aprenderam a ler suas primeiras palavras

usando essa ferramenta.

Mas esse não era o propósito do GrafoGame, o GrafoGame está aí para apoiar

no processo de alfabetização, né?

Até tem um guia que nós disponibilizamos que fala sobre isso, né?

Que o jogo deve ser usado como um apoio, que não descartaria a presença do professor

em sala de aula.

Então, essa combinação da formação dos professores, uma formação baseada

em ciências científicas, com um aplicativo que é acompanhado por uma comunidade acadêmica

do mundo afora, né?

Fez com que várias crianças aprendessem a ler.

Ontem mesmo, eu sem querer vi aqui nas redes sociais,

crianças jogando o GrafoGame no município de Capim Branco.

Eu não sei se vocês assistiram ao documentário que foi feito em Capim Branco

sobre a implementação dos programas da Secretaria de Alfabetização

na rede de ensino.

É um negócio, assim, espetacular.

Porque são crianças...

Eu fico até emocionado porque eu estive lá e eu vi crianças que voltaram do período, né?

Da pandemia, que não passaram pela pré-escola e que, por meio das ações

da Secretaria de Alfabetização, aprenderam a ler com muito mais facilidade.

Eu tive o privilégio de acompanhar o testemunho de uma professora

com mais de 20 anos de experiência em alfabetização,

uma professora realmente muito experiente, nós não podemos desconsiderar

a experiência de nossos professores em sala de aula, né?

Onde tudo acontece.

E ela diz, o programa Tempo de Aprender, da Secretaria de Alfabetização,

me desconstruiu, né?

Eu passei a usar as atividades das formações e, em pouco tempo,

vi resultados em minha turma, levando em consideração o seguinte,

ela recebeu crianças que não tinham passado pela pré-escola,

porque estavam retornando do período de pandemia.

Então, veja, em poucos meses, eles conseguiram resultados brilhantes,

e hoje o município dá continuidade a essas ações, envolvendo as famílias,

estabelecendo uma relação muito estreita entre família e escola,

por meio das ações que foram disponibilizadas pela Secretaria de Alfabetização.

Professor, o senhor acha que a tecnologia também pode ajudar

para quem opta pelo homeschooling?

E, de uma forma geral, o que o senhor acha dessa alternativa também

para a educação, principalmente para os mais jovens, né?

Para a educação básica?

Sobre educação no dia a dia?

A pergunta?

Exato.

Eu tenho alguns dados aqui para a gente refletir um pouquinho

sobre educação básica.

Nós temos hoje no Brasil 47 milhões de matrículas na educação básica.

Dessas 47 milhões de matrículas, 38 estão na rede pública de ensino.

Então, a educação domiciliar é uma alternativa, tá certo?

Ela deve ser defendida mais em função do que?

Do direito, da liberdade que os pais têm de instruírem seus filhos

da forma que considerarem mais adequada.

Porém, nós temos aqui na educação básica que dar prioridade

à rede pública de ensino pelos números.

Porque, veja só, você vai educar seu filho em casa, ok?

Acho que todos devem ter o direito de escolher qual é a melhor modalidade

a ser adotada para instruir seus filhos, né?

Mas lá, depois do ensino médio, o que vai acontecer?

Um encontro daquelas crianças que estavam na rede pública,

seja na rede privada, na educação básica, né?

Seja na rede privada ou pública, com essas que foram educadas em casa.

Então, eu sempre, assim, depois de minha experiência no Ministério da Educação,

eu sempre falo o seguinte, as políticas públicas e educacionais

voltadas à rede pública de ensino, elas influenciam a educação privada.

Isso é algo, para mim, muito claro, tá?

Então, nós precisamos trabalhar em várias frentes e priorizar a rede pública.

Diante desses números, não há outra escolha, né?

Então, a minha visão é essa, nós precisamos melhorar a qualidade da educação básica no Brasil, né?

E também, né, defender a liberdade dos pais que optam por instruir seus filhos em casa.

Mas, veja, uma coisa é a luta pela melhoria da qualidade educacional.

Outra coisa, apresentar uma modalidade de ensino como solução para esse problema.

É evidente que essa modalidade é importante, é positiva para os pais que fazem uso dela.

Mas a discussão que eu vejo, assim, é uma confusão, muitas vezes,

de, olha, diante do quadro da educação brasileira, vamos instruir nossos filhos em casa.

Tá entendendo?

Então, assim, eu, até como católico, acho que isso chega a ser uma falta de caridade cristã.

Basta visitar escolas públicas, crianças que, muitas vezes,

fazem suas principais alimentações durante o período escolar,

pra você começar a mudar um pouco de opinião sobre o que é prioridade em educação.

Ok?

Então, essa é a minha visão.

Essas famílias precisam, sim, ter o direito de escolher a modalidade que consideram mais,

a modalidade educacional que consideram mais adequadas,

mas nós precisamos priorizar a rede pública de ensino,

porque nós temos ali uma concentração de matrículas, um número expressivo de matrículas.

Educando em casa, por meio da educação domiciliar,

ou recorrendo ao ensino público, ao ensino privado, onde quer que se eduque,

como é que a gente pode incentivar e melhorar a relação pais e filhos?

A presença dos pais na educação dos filhos, o interesse dos pais pela educação dos filhos?

Vamos lá.

Eu vou até retomar um pouco esse tema, que é interessante.

Existe na literatura um conceito de capital familiar para aprendizagem.

O que significa isso?

É um conjunto de variáveis responsáveis por certos preditores de desempenho no ensino formal.

Então, por exemplo, crianças, oriundos, de famílias,

cujos pais possuem uma qualificação profissional, ensino superior,

possuem muitos livros, sobretudo livros de literatura infantil,

e também materiais de apoio pedagógico,

essas crianças têm um desempenho superior lá no quarto ano do ensino fundamental.

Estou falando de crianças na primeira infância, tá?

Então, crianças que na primeira infância receberam estimulação de famílias

que possuem essas características, tendem a ter sucesso escolar, ok?

Então, veja, você precisa, no ambiente escolar, aliar dois universos.

Primeiro, analisar as crianças que possuem um elevado capital familiar para aprendizagem

e aquelas que não possuem um capital tão elevado.

E, de outro lado, o que as pesquisas mostram?

O que mais conta para o sucesso escolar é a apropriação dos objetivos curriculares

que são estabelecidos pela escola, por parte do corpo docente, dos coordenadores

e também dos próprios pais, né?

Nesse sentido, o envolvimento das famílias na escola significa o quê?

As famílias, primeiro, tomarem consciência dos objetivos curriculares

e auxiliarem os filhos, no caso, a atingi-los, tá certo?

Então, o que acontece no Brasil?

Muitas vezes, crianças que estão matriculadas, sei lá, na rede privada

têm um desempenho escolar X em função do capital familiar para aprendizagem, tá certo?

Então, outras vezes, nós temos uma confusão entre educação domiciliar

e práticas de literacia familiar, que é um outro tema interessantíssimo

para ser explorado. Por quê?

Uma coisa é a educação formal, que é de natureza curricular, ok?

Outra coisa é a orientação informal, que pode ser estruturada ou não estruturada.

Então, os pais de famílias de classe média alta,

que não vivem em situação de vulnerabilidade social,

cultivam certos hábitos que favorecem depois a aprendizagem da leitura, por exemplo, tá certo?

E aí, muitas pessoas confundem a educação formal com a orientação informal estruturada.

São universos distintos, tá certo?

Então, a participação da família é fundamental na educação dos filhos,

não foi à toa que o governo federal lançou o programa Conta Pra Mim,

que é um programa de promoção de práticas de literacia familiar,

ou seja, um programa que incentivava os pais a lerem em voz alta seus filhos,

a melhorarem a qualidade de interação verbal com crianças pequenas,

porque as pesquisas mostram o impacto disso no futuro escolar dessas crianças.

Não sei se vocês já viram algumas das evidências científicas,

há uma que mostra assim, crianças oriundas de famílias pobres, aos quatro anos,

ouviram 30 milhões de palavras a menos do que as de classe média alta.

É evidente que isso tem um impacto no desenvolvimento da linguagem dessas crianças

e na compreensão oral delas.

Em leitura, existe uma fórmula muito básica,

você primeiro desenvolve o vocabulário receptivo,

depois aciona o expressivo por meio do receptivo,

e em seguida aprende a ler e a escrever.

A leitura está para escuta, assim como a fala está para escrita.

Então, um bom leitor é, antes de mais nada, um bom ouvinte,

porque, no fundo, quando você lê um texto, o que acontece?

Você tem ali uma espécie de mapeamento de realidades sonoras da fala.

Então, sabendo ler, você converte aqueles sinais gráficos, símbolos gráficos,

em um episódio de fala.

Então, você se porta como um ouvinte ao ler.

Até acho curioso, muita gente fica romantizando a leitura,

falando que é um ato de meditação, e assim, desculpe-me,

eu sou meio contra romantismo, uns pedagógicos.

Ler é ouvir alguém que está ausente, ponto final.

Então, se você quer formar um bom leitor, você precisa, antes, formar um bom ouvinte.

E esse é um tema que não é debatido no meio conservador.

Fala-se de analfabetismo funcional, querem combater esse problema,

e ninguém discute um tema que é crucial para que isso aconteça,

que é a fluência em leitura oral.

Fala-se em baixa capacidade de compreensão textual,

e ninguém fala sobre compreensão oral, compreensão auditiva.

Por exemplo, tem outra fórmula interessante, no relatório da Câmara.

Compreensão em leitura é igual compreensão oral,

vezes reconhecimento automático de palavras.

É assim que funciona o processo.

Então, quando você faz uma avaliação, fica fácil de constatar

se a criança tem um déficit em decodificação de palavras,

ou em compreensão oral, e aí você faz a intervenção adequada.

Enfim, então...

Se eu entendi bem uma coisa,

quero dizer de uma forma bem resumida para quem está nos ouvindo,

é possível concluir de uma forma resumida, de uma forma ampla,

que as crianças que estiverem sendo criadas em lares

com pais mais habituados ao estudo,

com pais com um vocabulário maior,

com pais que têm livros em casa,

crianças que veem os exemplos de pais que estudam,

essas crianças têm um melhor desenvolvimento na sua própria educação.

Podemos considerar isso?

Sim, a ciência diz isso.

A ciência diz que os pais são os primeiros e principais professores de seus filhos.

Porém, com isso, a ciência não está dizendo

que os pais devem assumir a educação formal das crianças.

Está entendendo?

Isso aí nada mais é do que orientação informal,

que pode ser estruturada ou não estruturada.

O que é a orientação informal?

É uma aculturação pela qual todos nós passamos.

Só que há ambientes que são mais ricos e outros não.

Foi por essa razão que o Ministério da Educação lançou o programa Conta Pra Mim

e estabeleceu uma parceria com o programa Criança Feliz.

Não sei se vocês conhecem.

O programa Criança Feliz é o maior programa de visitação domiciliar do mundo,

que atende crianças, famílias que estão no antigo Auxílio Brasil.

Então, o que aconteceu ali?

Por meio do Conta Pra Mim, nós elaboramos uma formação para os assistentes de alfabetização,

para os visitadores do programa Criança Feliz,

receberam uma formação que foi elaborada pela Secretaria de Alfabetização,

e nessa formação destacávamos a importância das práticas de literacia familiar.

Ou seja, por que os pais precisam contar histórias para os filhos,

por que os pais precisam melhorar a qualidade de interação verbal com as crianças.

Um detalhe importante, as práticas de literacia não estão voltadas apenas a pessoas letradas.

Analfabetos podem melhorar a qualidade de interação verbal com crianças pequenas, sim.

Então, veja, com essa parceria, os assistentes iam até as casas dessas famílias

que vivem em situação de vulnerabilidade social, davam essas instruções,

e levando em consideração a pesquisa que mencionei há pouco

sobre a quantidade de livros infantis em casa,

o governo então distribuiu livros para essas famílias.

Então, veja, que nós priorizamos as famílias que viviam em situação de vulnerabilidade social

e levamos em consideração duas variáveis importantes,

a formação desses pais e também a entrega dos livros infantis.

Então, para quê? Para melhorar o ambiente e aumentar o capital familiar

para a aprendizagem dessas crianças.

É claro que as práticas de literacia geram outras consequências,

como, por exemplo, o fortalecimento dos laços familiares.

Você passa a ler para uma criança, a conversar mais com ela,

evidentemente você tem uma intensificação ali da relação entre adultos e crianças.

Então, nós vimos que por meio dessas práticas nós melhorávamos a linguagem das crianças,

as funções executivas, que é outro tema interessantíssimo,

as crianças precisam calibrar certas funções que são acionadas para aprender qualquer coisa.

Vou dar um exemplo aqui. Controle inibitório.

Você tem um impulso interno e precisa, de certa maneira,

modelá-lo a fim de que você se comporte da forma que se espera em um determinado ambiente.

Então, essas habilidades são trabalhadas na educação formal e também por meio de práticas de literacia

que são conduzidas pelas famílias.

Então, uma coisa é uma família de classe média alta,

que naturalmente acaba promovendo essas estimulações,

outra coisa são as famílias que vivem em situação de vulnerabilidade social.

Lógico que a prioridade do programa eram as famílias que viviam em situação de vulnerabilidade social.

E os visitadores do programa Tempo Criança Feliz abraçaram a conta para mim de uma maneira incrível.

Então, nós ficávamos impressionados com o engajamento desses visitadores.

Eu acompanhei a entrega dos livros e muitas vezes testemunhei crianças que, pela primeira vez,

estavam recebendo em casa um livro de literatura infantil.

O Brasil é um dos países que mais gasta com educação no mundo, proporcionalmente,

mais até do que países da OCDE, mas infelizmente o resultado não vem.

Todos os rankings aí, PISA e outros rankings que avaliam a qualidade da educação,

estão sempre lá embaixo da tabela.

Dá para dizer que o que não falta é dinheiro?

Aqui no Brasil nós não podemos reclamar de faltas de recurso,

mesmo assim a gente vê sempre os políticos dizendo que vão prometer mais recursos,

mais dinheiro para a educação.

É esse o problema?

Como é que a gente sai dessa armadilha de achar que é mais dinheiro que vai resolver?

Valeu, o Nuno Krato respondeu a sua pergunta na palestra que eu mencionei, lá em 2019.

Muito investimento em tecnologia, em infraestrutura, e tem algo que ele diz,

eu até me memorizei, se vocês quiserem, acessem aí, o vídeo está disponível na internet,

a abertura da primeira conferência nacional de alfabetização baseada em evidências.

O Nuno disse algo tão acessível, tão barato, custa tão pouco,

que é a elaboração de um currículo estruturado.

Esse é o começo de tudo.

Ele diz que a educação começa pelo começo e o começo é o currículo.

Então, eu acredito que um investimento, uma reformulação curricular

é fundamental para revertermos o quadro, a situação da educação básica no Brasil.

Nós temos aí a base nacional como curricular, ela não é um currículo,

ela orienta a elaboração de currículos e há uma previsão de revisão desse documento.

Então, levando em consideração países como França, Inglaterra, Portugal e tantos outros,

nós podemos fazer uma comparação entre esses currículos e imitar o que funcionou no mundo afora,

e também aqui no Brasil.

Há municípios que possuem currículos estruturados e têm apresentado um bom desempenho

nas avaliações nacionais.

Então, eu acho que esse é o grande investimento.

Professor, gostaria de uma consideração final sua, respondendo uma coisa simples.

Por que as pessoas deveriam assistir a sua aula dentro da Travessia da Brasil Paralelo?

O que elas podem esperar?

Bom, elas podem esperar uma exposição muito objetiva, recheada com dados

de como a Secretaria de Alfabetização conseguiu converter pesquisas científicas

e tantos outros dados educacionais em políticas públicas e educacionais.

Por quê?

Muitos falam sobre os problemas da educação, e eu acho que o público em geral já está cansado disso.

Nós precisamos de soluções, soluções realistas, atíveis.

E nós, durante quatro anos, conseguimos, por meio do uso de evidências científicas,

converter em ações, em iniciativas, coisas que desejávamos.

Por exemplo, quem aqui já falou que um dos problemas da educação brasileira

é o de alunos que não sabem redigir um texto?

Acredito que a maioria.

Bom, saibam, senhores, que o Ministério da Educação publicou um curso de redação

que é um dos melhores que esse país já viu.

O curso chama-se Práticas de Produção de Textos, disponível gratuitamente

no site do Ministério da Educação.

Quem aqui já não falou sobre o problema do analfabetismo infuncional?

Nós lançamos uma formação que foi elaborada por especialistas portugueses

de altíssimo nível para que nossos jovens e alunos aprendam efetivamente a ler.

Então, eu acho que nós precisamos entender o problema e estudar de que maneira

podemos realmente elaborar instrumentos para atacar o problema.

Eu vejo muitas vezes dados alarmantes, mas e aí?

Qual a solução que você tem para nos apresentar?

Aí vem a pergunta.

Com uma experiência pessoal, querendo replicar isso em escalação.

Isso é uma absurdidade.

Em palestra educacional costuma ser o seguinte.

Tudo isso aí que você está falando que funciona, onde foi que você implementou

e onde estão os dados do impacto disso que você está falando que realmente funciona?

Eu tenho os dados do programa Tempo de Aprender, eles estão disponíveis, são públicos.

As redes que participaram do programa, as crianças que participaram do programa

Tempo de Aprender, a pesquisa mostra que elas têm de 23% a 27% a mais de chances

de concluírem o ciclo de alfabetização e adquirirem a fluência em leitura

que se espera para o segundo ano do que aquelas que não participaram do programa.

Então, isso, nós temos que trabalhar com dados no ambiente educacional.

E é isso que eu apresento na minha exposição, dentro do limite de tempo que eu tinha ali.

Então, eu mostrei assim, aqui estão, isso aqui é educação básica brasileira,

nós temos um problema gravíssimo que é a doença da leitura.

Por que é um problema grave?

É que nós temos os dados das avaliações nacionais, nós temos o reflexo disso no PISA,

o pessoal fala muito sobre o PISA, ENEM, mas não analisa os dados do Saeb, por exemplo.

Nem sabe o que é Saeb, muitas vezes, e tá lá falando mal da educação, falando que é um problema, etc.

Então, eu mostrei tudo isso aqui, o que a ciência diz, mostrei algumas evidências

sobre como ensinar uma criança a ler, um jovem, um adulto, e o que nós fizemos e os resultados, certo?

Então, nós precisamos debater educação, levando em consideração evidências.

O que funcionou, como foi, para podermos replicar as doenças exituosas e melhorarmos essa situação.

Porque, assim, a descrição do problema já tá virando um hit aí que todo mundo tá se cansando de ouvir, certo?

Ah, a educação brasileira vai mal, tal.

Poxa, você realmente está preocupado com esse assunto?

É muito comum ouvir isso sendo repetido.

Se estivesse, apresente as suas propostas.

Nós temos hoje dados de que os programas da Secretaria de Alfabetização funcionaram.

Funcionaram, mudaram a realidade de municípios brasileiros.

Crianças que, pela primeira vez, receberam ali um livro de literatura infantil.

Vou te dar outra, não sei se eu posso falar mais um pouquinho aqui.

Eu concluí a minha apresentação dizendo o seguinte, olha, fujam dos romantismos pedagógicos.

Os romantismos pedagógicos, eles não são uma propriedade exclusiva dos progressistas.

A direita também cultiva vários deles, certo?

Então, assim, o que é o romantismo pedagógico?

É aquele discurso educacional adocicado, entendeu?

Que deixa a plateia toda feliz, mas que não tem impacto nenhum no chão da escola.

E tem detalhes sobre isso na sua aula.

Tem detalhes sobre isso.

Não, eu não dei exemplos lá. Eu só chamei atenção, mas eu posso dar aqui.

Por exemplo, esse estudo que eu mencionei, o PERCS, é o principal estudo para a ferição de compreensão e leitura no 4º ano do ensino fundamental.

Ponto final.

Quem não conhece esse estudo e está falando sobre problemas de compreensão textual não sabe o que está dizendo.

Ali você tem claramente as finalidades de leitura.

Uma que é de você ser capaz de ler textos informativos.

E outra finalidade que é a compreensão de textos ficcionais.

Então tem um domínio dentro desse estudo de avaliação que é a educação literária de crianças.

Só que isso não é tratado de forma romântica.

Como é que eu vou aferir se uma criança realmente está entendendo um texto ficcional?

Bom, ela precisa primeiro demonstrar que é capaz de localizar, extrair uma informação explícita desse texto.

Mas basta isso? Não.

Segunda etapa. Você precisa elaborar itens para saber se ela está fazendo inferências diretas.

Ou seja, relacionando elementos que estão explícitos do texto.

Num terceiro momento ela tem que ser capaz de interpretar o texto.

Muita gente confunde compreensão com interpretação.

Compreensão é você extrair o que está ali.

Interpretação é relacionar conhecimentos prévios que você possui com o que você está lendo.

E a quarta etapa é a emissão de um juízo.

Você analisa, avalia o que foi lido e emite um juízo.

Então, o PORS avalia isso.

Então, ali é uma coisa natural você esperar que uma criança saiba ler obras ficcionais.

Então, você acompanha países europeus, você tem programas de governo com a indicação de obras literárias.

Ligo clássicos, obras que não são muito boas.

Mas ninguém fica romantizando isso.

Falando que você precisa ler o clássico para melhorar o seu caráter, porque você vai ficar mais virtuoso.

Você não vê essas coisas em pesquisas científicas sobre a importância de se ler obras ficcionais.

Você não vai estabelecer um debate sério argumentando dessa maneira.

Você pega os dados do PISA.

Por exemplo, os jovens que liam com mais frequência obras ficcionais tinham um melhor desempenho em compreensão textual do que aqueles que liam revistas, alguns tipos de textos informativos, etc.

Então, isso é um consenso na literatura que não deve ser tratado com romantismos.

Então, por exemplo, tem muito no meio conservador aquilo que eu chamo de tese de transferência.

Eu não, o próprio Nono Kraton.

Ele ministrou uma palestra e ele dá exemplos disso.

Essa promessa de que você vai escutar uma coisa e vai ficar melhor em outra.

Não sei se vocês já viram esse tipo de discurso.

O camarada chega e diz para você assim, olha, aí não é bem transferência, mas é algo análogo.

Olha, dependendo do temperamento de uma criança, esse assunto está em voga aí, né?

Uma coisa curiosa.

Ela vai subtrair ou somar melhor.

Sei lá, se ela for melancólica, ela vai subtrair melhor.

Ou ela vai tornar um passo que, se for colérico, vai somar.

E com relação entre uma coisa e outra, entende?

Então, essas coisas, isso tudo são romantismos pedagógicos.

Por exemplo, você vai aprender a escrever levando em consideração seus gostos pessoais,

a sua experiência literária, etc.

Olha, eu tenho um livro aqui, de um português, que explica, ele mapeia o cérebro e todas,

tudo que é acionado no lado da escrita.

E aí é só você fazer uma avaliação do que ali não está funcionando, para melhorar essas habilidades.

Então, eu concluo minha aula dizendo, olha, cuidado com os romantismos pedagógicos,

porque eles circuntam também no meio conservador, que vive criticando a situação da educação,

e falando que a culpa é de uma ala política, etc.

Mas apresenta como solução para o problema, muitas vezes, né?

Teses que são, por sua vez, também românticas.

Eu tenho certeza de que foi fundamental para todos ouvirem do senhor também a importância da leitura ficcional.

Deixar as crianças terem contato com histórias.

E histórias é o nosso negócio, né, Renato?

Nós também contamos histórias na Brasil Paralelo, contamos histórias brasileiras,

histórias nacionais nos nossos documentários, nos filmes que nós contratamos na nossa plataforma.

Contamos histórias que têm bons valores, boas ideias e bons sentimentos.

Com travessia não seria diferente.

Lá você vai ter uma jornada de estudos que vai aumentar muito a sua bagagem, vai te ajudar na sua casa, na sua família.

Você, pai, você, mãe, que nos acompanhou até agora, invista nos seus estudos e nos seus conhecimentos para poder ajudar os seus filhos, tá bom?

Professor Carlos Nadalim, muito obrigado pela sua presença, uma boa noite.

Renato, boa noite.

Belo papo, Victor, obrigado, professor. Obrigado a todos que acompanharam.