Covid-19: afinal, Brasil vacina pouco ou muito? Confira 5 dados do ranking global
Praticamente todos os dados que tratam da situação do Brasil na pandemia de coronavírus
são questionados, comparados, recortados ou distorcidos desde que a doença chegou
oficialmente ao país, em fevereiro de 2020.
Como as quase 500 mil mortes são atualmente incontornáveis, as críticas ao governo de
Jair Bolsonaro e os contrapontos a elas têm se concentrado no desempenho brasileiro na
vacinação.
Afinal, o Brasil vacina pouco ou muito?
Eu sou Matheus Magenta, da BBC News Brasil, e hoje eu vou apresentar alguns gráficos
para explicar por que o governo Bolsonaro afirma que o Brasil é um dos líderes mundiais
em vacinação.
E por que não é bem assim quando essa comparação leva em conta o tamanho da população de
cada país ou território.
O Brasil, no ranking mundial da Our World in Data, é o 3º país que mais aplicou a primeira dose de vacina
Estados Unidos, Índia e Brasil
Quando o governo brasileiro fala isso, ele está levando em conta o número total de
doses que cada país aplicou, tenha ele 1 milhão ou 1 bilhão de habitantes.
Assim, o quarto lugar nesse critério, segundo dados oficiais compilados pela Universidade
de Oxford, é de certa forma um patamar esperado para o sexto país mais populoso do mundo.
O Brasil tem 212 milhões de habitantes.
E além disso, foi um dos mais atingidos pela doença, com o segundo maior número de mortes
no mundo, atrás apenas dos Estados Unidos.
Mas quando a comparação do total de doses aplicadas leva em conta o tamanho da população
de cada país, o Brasil aparece em 85º entre mais de 200 nações e territórios.
Se levarmos em conta apenas lugares com mais de 10 milhões de habitantes, o Brasil está em 22º.
O Reino Unido aplicou 101 doses para cada 100 mil habitantes. O Brasil aplicou um terço,
35 para cada 100 mil pessoas.
Eu vou apresentar 5 maneiras de comparar esses dados levando em conta o tamanho da população.
Mas antes é importante fazer a comparação com o próprio Brasil, conhecido no mundo
todo por sua capacidade histórica de vacinar um monte de gente.
O Ministério da Saúde brasileiro afirma que o país tem capacidade instalada de vacinar
2,4 milhões de pessoas por dia.
E já chegou a vacinar 18 milhões de crianças em campanha contra a poliomielite.
Mas nessa pandemia, de janeiro a maio de 2021, o Brasil só superou dez vezes a marca de
1 milhão de vacinados em 24h.
A China, por exemplo, tem conseguido vacinar até 20 milhões por dia.
Enfim, vamos aos gráficos com a seguinte ressalva.
Os dados brasileiros, por serem descentralizados, costumam ter ligeiras diferenças a depender
da fonte.
As comparações neste vídeo se baseiam nos dados oficiais mais recentes de cada país
e coletados pela Universidade de Oxford, aqui do Reino Unido.
Primeiro: Quantas doses foram aplicadas ao todo?
O dado do total de doses aplicadas no Brasil é o principal argumento utilizado para exaltar
o avanço do programa de vacinação brasileiro.
Nesse quesito, levando em conta os dados da Universidade de Oxford, o Brasil aparece em
4º lugar no ranking global, com 75 milhões de aplicações. Fica atrás de China (808
milhões), EUA (303 milhões), e Índia (233 milhões).
Segundo. Que porcentagem da população recebeu pelo menos uma dose?
Até o momento em que eu gravei esse vídeo, 932 milhões de pessoas receberam pelo menos
uma dose contra a covid-19 ao redor do mundo. Isso equivale a 12% da população do planeta.
No caso do Brasil, o país havia aplicado uma dose em 24% da população brasileira.
Isso coloca o país em 75º (septuagésimo quinto) lugar no ranking de 195 nações e
territórios.
No continente americano, o país mais bem posicionado é o Canadá, que aplicou pelo
menos uma dose em 63% da população e está em 11º no ranking global.
Terceiro. Que porcentagem da população recebeu duas doses?
Com exceção da vacina da farmacêutica Janssen, todos os imunizantes precisam de duas doses
para atingir a máxima eficácia contra o coronavírus.
Alguns países, como o Reino Unido, deixaram um pouco de lado as recomendações dos fabricantes
de vacinas e decidiram ampliar o intervalo entre as duas doses para garantir logo a imunização
parcial de um número maior de pessoas.
O Brasil, por outro lado, segue o que cada fabricante recomenda para a imunização completa.
No ranking da proporção da população que recebeu duas doses, o Brasil imunizou 11%
de sua população e aparece em 77º no mundo.
Quarto. Qual é a velocidade do programação de vacinação?
Como eu disse antes, o Brasil sempre foi conhecido pela velocidade e extensão de seus programas
de vacinação.
Na pandemia atualmente, podemos avaliar a velocidade de doses aplicadas diariamente
considerando o tamanho da população.
Atualmente, o Brasil vacina 4.232 pessoas por dia a cada 1 milhão de habitantes. Isso
é basicamente um terço do que consegue a China, mas está no mesmo patamar da média
global, de 4.367.
Nesse quesito, o Brasil aparece em 78º lugar no ranking global. Se levarmos em conta o
número absoluto de doses aplicadas por dia, sem levar em conta o tamanho da população,
o Brasil aparece em quarto, atrás de China, Estados Unidos e Índia.
O Brasil tem tido bastante dificuldade para conseguir acelerar seu programa de vacinação
contra a covid. Há diversos fatores, mas o principal deles é a escassez de doses.
Depoimentos à CPI da Covid apontaram que o Brasil poderia ter 50% a mais de vacinas
hoje se tivesse o governo Bolsonaro tivesse comprado as vacinas da Pfizer e do Instituto
Butantan quando elas foram ofertadas pela primeira vez.
Ou seja, 150 milhões de doses em vez de 100 milhões. Segundo o epidemiologista Pedro
Hallal, da Universidade Federal de Pelotas, essas doses poderiam ter salvado 95 mil vidas.
O governo Bolsonaro nega ter atrasado a compra e afirma ter seguido critérios técnicos.
Desde fevereiro de 2021, o Brasil leva de 12 a 14 dias para aplicar 10 milhões de doses
contra a covid-19. E não passa disso.
Esses números de doses aplicadas têm levado a embates entre o governo federal e os estados
e municípios.
No início de junho, o Ministério da Saúde dizia ter distribuído 100 milhões de doses,
mas somente 71,6 milhões tinham sido aplicadas, segundo dados do ministério.
Eu falei com todas as 27 secretarias estaduais de saúde e há um monte de explicações
para essa diferença. Há municípios que demoram para aplicar a vacina. Outros guardam
as doses para a segunda aplicação.
Há quem fale que demora até as doses chegarem às unidades de saúde dos 5.570 municípios.
E a maioria diz que os dados do governo federal estão desatualizados.
Agora o quinto e último ponto. Quantas doses foram compradas ao todo?
No papel, o cronograma atual do Ministério da Saúde prevê mais de 500 milhões de doses
Levantamento da Universidade Duke, nos Estados Unidos, aponta que o Brasil é o sexto maior
comprador de vacinas no mundo, com 370 milhões de doses compradas (e outras 208 milhões
com opção de compra negociada).
Ele fica atrás da União Europeia (1,8 bilhão), dos EUA (1,2 bilhão), do consórcio Covax
(coordenado pela Organização Mundial da Saúde para beneficiar países mais pobres
com 1,1 bilhão de doses), da União Africana (670 milhões) e do Reino Unido (457 milhões).
Das mais de 500 milhões de doses do Brasil, o governo federal previa a entrega de 154
milhões delas no primeiro semestre de 2021.
Mas dificilmente o Brasil conseguirá cumprir esse cronograma por causa principalmente de
atrasos no envio de matéria-prima da China.
Se conseguisse cumprir esse plano, daria para vacinar todas as 78 milhões de pessoas dos
grupos prioritários até julho.
Agora, o Ministério da Saúde estima que isso deve acontecer no fim de agosto, início
de setembro. Mas as previsões mudam o tempo todo.
O governo de São Paulo, por exemplo, disse que vai vacinar todos os adultos, prioritários
ou não, até 31 de outubro.
É isso. Espero que este vídeo tenha ajudado você a entender melhor esses números.
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Obrigado, até a próxima.